ESCRAVATURA

juiz
A escravatura traduz-se numa prática social em que um ser humano se arroga direitos sobre outro que mantém na sua dependência absoluta e incondicional.
É possível surpreender, ao longo da História, várias formas e modalidades de escravatura nos diversos povos que a praticaram. Quando a escravidão era integral, o escravo era juridicamente considerado uma coisa, o que dava ao respetivo dono a possibilidade de fazer dele o que quisesse, ou seja, exatamente o mesmo que lhe seria permitido fazer com qualquer objeto seu.
A condição jurídica do escravo segundo o Código de Hamurabi é traçada da seguinte forma: “era considerado como um bem móvel entre os metais preciosos e os animais domésticos, podendo ser vendido, trocado ou depositado como garantia”.
Os escravos podiam ser vendidos ou comprados sem que pudessem manifestar qualquer oposição. O preço de cada um variava conforme a idade, a compleição física, a habilidade profissional, etc. Porém, em Esparta, os hilotas não podiam ser transacionados, porque pertenciam ao Estado, embora este pudesse conceder a outrem o direito de uso de alguns.
Praticamente todos os povos adotaram a escravatura. Foi assim com os povos da Mesopotâmia, com os Hebreus, Romanos, Celtas e Gregos. Nas épocas mais remotas os escravos resultavam dos conflitos tribais. Os vencidos poupados à chacina eram reduzidos à condição servil, sem quaisquer direitos. Esta atitude já significava uma certa condescendência, visto que lhe era poupada a vida, e era uma forma de obter mão de obra para a produção num tempo em que não existiam máquinas. Filósofos e juristas procuravam encontrar uma justificação para esta prática. Entre os primeiros, Aristóteles considerava que se tratava de algo natural.
A doutrina da Igreja aceitava este modo de escravatura quando se tratava de prisioneiros feitos em guerras “justas”. O conceito permitia, porém, variadas interpretações. A certa altura, em Angola ter-se-á mesmo adotado a prática de o Governador consultar a tal respeito os Jesuítas sobre se determinada guerra que estava a ser planeada seria considerada “justa” para aquele efeito.
Parece que a escravatura de negros não terá sido uma “invenção portuguesa” como tem sido muitas vezes propalado. Constituiu antes a persistência do tráfego Veneziano no Mediterrâneo durante os séculos XIV e XV. Quando os portugueses chegaram a África já era praticada largamente em Marrocos, na Argélia, na Tunísia e no Egito.
“Os primeiros cativos feitos pelos navegadores do Infante D. Henrique entre os azenegues do Sul de Marrocos não obedeceram a intuitos esclavagistas, mas à intenção de contacto com os aborígenes ou de represálias. Só mais tarde, a exemplo dos Genoveses e Venezianos, os descobridores e comerciantes se lançaram no tráfico propriamente dito, constituindo para esse efeito, ligado também ao comércio de ouro e marfim, a Companhia de Mercadores de Lagos”.
Para a recolha dos escravos em África contribuíam os chefes indígenas que vendiam os prisioneiros de guerra tribais, criminosos reduzidos à escravatura ou ainda os que voluntariamente se ofereciam por sentirem a carência de alimentos em anos de secas ou de pragas que dizimaram os campos.
A luta contra a escravatura ia ganhando dimensão. Fazia-se sentir a necessidade de lhe pôr cobro, mas não era fácil. Certas culturas agrícolas, como a da cana do açúcar, no Brasil, não se podiam fazer sem a mão de obra escrava. Mas, para além disso, também as famílias em Portugal começaram a ter escravos ao seu serviço. Em 1551, dos 100.000 habitantes de lisboa, cerca de 10% eram escravos pretos.
Apesar disso, o Marquês de Pombal aboliu a escravatura a 12 de Fevereiro de 1761, passando Portugal a ser o primeiro no abolicionismo. Contudo, a grande extensão dos territórios sob o domínio português e as dificuldades de controlo fizeram com que muitos negreiros tivessem continuado a fazer o transporte de escravos africanos. Finalmente, a 25 de Fevereiro de 1869, teve lugar a abolição prática e completa da escravatura em todo o Império Português.
Será que a partir desta data não mais se pode falar de escravidão? Infelizmente ainda nos dias de hoje existem várias formas de escravidão: trabalho forçado, servidão obrigatória, tráfico de mulheres e de crianças, exploração sexual, trabalho infantil, casamentos forçados, tráfico para a remoção de órgãos, escravidão por dívidas, venda de noivas, recrutamento de crianças em conflitos armados, etc., etc.
Para relembrar que ainda existem estas formas de escravidão, foi criado, em 2004, o Dia Internacional da Abolição da Escravatura pela Organização das Nações Unidas (ONU), que estima que existam 21 milhões de vítimas de escravidão espalhadas pelo Mundo. A data passou a ser a de 2 de Dezembro.