A Convenção Sobre os Direitos da Criança

juiz
Em 20 de Novembro de 1989, as Nações Unidas adotaram, por unanimidade, a Convenção Sobre os Direitos da Criança, o que quer dizer que perfez recentemente 30 anos. Portugal ratificou-a em 21 de Setembro do ano seguinte.
A Convenção constitui um marco de mudança, porque aos direitos básicos que, como é evidente, não podiam deixar de estar presentes, visto que são o pródromo dos demais, seguem-se aqueles que constituem uma verdadeira inovação, como o direito à opinião, o direito à liberdade de expressão, o direito de reunião e o direito à privacidade.
Na impossibilidade de fazer referência a todos estes direitos inovadores, focaremos por ora, embora de forma sucinta, sobretudo o direito de emitir opinião.
Relembraremos, no entanto, que o interesse superior da criança deve estar subjacente a qualquer decisão em que a mesma esteja em causa. Cada Estado que ratificou a Convenção passou a ser responsável por que as normas que respeitam aos direitos nela contemplados não constituam letra morta.
Começa a Convenção por definir a criança como sendo todo o ser humano menor de 18 anos.
Em Portugal a maioridade civil só se atinge a partir dessa mesma idade, conforme resulta do disposto no artigo 122º do Código Civil. Ao perfazer 18 anos atinge-se a plena capacidade de exercício de direitos, por força do artigo 130º do mesmo diploma. Pode-se, porém, obter a emancipação, de pleno direito, pelo casamento, nos termos do artigo 132º ainda do Código Civil, sendo certo que a idade núbil começa aos 16 anos para ambos os sexos.
Cada Estado, ao ratificar a Convenção, assumiu o compromisso (previsto no artigo 2º) de evitar qualquer descriminação por causa da raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou de qualquer outra situação.
Em cumprimento do artigo 12º da Convenção, os Estados devem garantir à criança com capacidade de discernimento o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que são do seu interesse.
Recuando no tempo, concluímos facilmente que o dever dos pais de ouvir a opinião dos filhos estava ainda muito longe de ser concebido. Só numa época relativamente recente a criança adquiriu o estatuto de pessoa no sentido de sujeito de direitos. Inicialmente apenas estavam previstos os seus direitos mais elementares, onde não se incluía o de ter opinião. Este só surgirá muito mais tarde. Quer dizer, o respeito pela opinião da criança nos assuntos do seu interesse é fruto de uma demorada evolução, significando um longo caminho percorrido.
A criança deixou de ser vista apenas como um ser em desenvolvimento, cuja proteção cabia exclusivamente aos adultos, para ser tida como verdadeira titular do direito de emitir opinião sempre que estão em causa as bases da construção da sua própria vida.
Atualmente, o respeito pela opinião da criança encontra-se consagrado em vários artigos do nosso Código Civil. Ressalta desde logo que, de uma conceção autoritária dos pais, passou-se a um regime em que se procura dar a imagem de família solidária. Assim, enquanto anteriormente se determinava que “os filhos devem honrar e respeitar os pais”, hoje, concebendo uma posição mais igualitária entre pais e filhos, dispõe o artigo 1874º que “pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência”.
Embora o nº 2 do artigo 1878º disponha que “os filhos devem obediência aos pais”, logo o preceito acrescenta que estes devem ter em conta a opinião dos filhos nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida. Esta obrigação de auscultar a opinião dos filhos estará dependente do grau de desenvolvimento destes, apenas se tornando obrigatória nos casos em que já estejam em condições de emitir um juízo fundamentado acerca dos assuntos em discussão.
O direito de serem ouvidos, que os filhos adquiriram, manifesta-se ainda em outras disposições do Código Civil. No que tange ao exercício das responsabilidades parentais na constância do matrimónio, dispõe o artigo 1901º que pertence a ambos os pais e que deve ser exercido de comum acordo. Quando o acordo faltar, nas questões de particular importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal que tentará a conciliação. Mostrando-se a mesma impossível, a decisão caberá ao juiz, que terá de ouvir previamente o filho, salvo quando circunstâncias ponderosas o desaconselhem.
Fazendo um exame retrospetivo, verificamos que a lei impunha ao juiz a obrigação de ouvir o menor, antes de decidir, apenas nos casos em que ele já tinha atingido a idade de 14 anos. Atualmente não é fixado qualquer limite de idade o que significa que deve ser o seu grau de maturidade a determinar a obrigação de o consultar.
A idade a partir da qual se impõe que a criança seja ouvida, foi igualmente encurtada para os 12 anos nos casos de adoção, quanto aos filhos do adotante. Por sua vez, para a adoção é necessário o consentimento do adotando maior de 12 anos.
Igualmente, ao completar a idade de 16 anos, o menor alcança uma situação que se poderá designar por maioridade religiosa. Os pais só podem decidir sobre a educação religiosa dos filhos menores de 16 anos – artigo 1886º.
Muito mais poderia ser dito a tal respeito, mas teremos de ficar por aqui para não tornar demasiado extensa a exposição.