Novo ano, novas promessas: a harmonia de viver!

Ana Cruz
Estamos na época de analisar como foi o ano que passou e desejar que o novo ano traga oportunidades melhores! É maravilhoso ver a profusão de literatura a criar expectativas futuras, através de (e?!) vidências e considerar que o pior já passou e que o destino traz aventuras felizes! É festas de arromba realizadas com dinheiro a crédito, é pular até à exaustão para no dia seguinte acordar com a sensação de o mundo estar em cima da nossa cabeça, e ter a Feira Popular nos nossos ouvidos! É criticar novamente com o estado da Nação culpando os protagonistas da política, que com os seus sorrisos alvos e ardilosos, falam de utopias enquanto subtilmente vislumbra-se o cenário da primeira parte da Divina Comédia de Dante! Mas será que o Inferno, com todas as suas descrições poéticas e aterradoras e tão bem expressado em pinturas a óleo com caldeirões repletos de pessoas torturadas enquanto os demónios regozijam com a agonia e o sofrimento dos humanos pecadores, é algo fora do nosso controle?
Se versamos da filosofia “Nascer para sofrer”, o mais fácil é aceitar que o sofrimento significa vida e que estamos neste mundo para ter dor, porque honestamente ultrapassar um processo de sofrimento físico, psicológico ou espiritual é muito difícil! Ter esperança, ter confiança que algo de bom pode ocorrer é um caminho há muito esquecido, porque vivemos e revivemos o passado e transportamos todas essas experiências para um futuro que não existe, mas que já nos ocupa tempo. Tempo presente! Estar presente, estar atento ao que se passa hoje e evitar pré ocupar o hoje com o amanhã. “Hoje não tenho tempo para isso” ou “Quando tiver de férias faço isso” ou “Estou à espera de dias melhores… ” são desculpas que a nossa mente tem para fugir à adaptação e mudança. Para quem foi sujeito a uma crítica constante, desse a infância até à fase adulta, “aprendeu” que apenas a perfeição é plausível e que a diferença e o erro são incorrectos e inaceitáveis. De fato, essas pessoas constantemente relembram as palavras amargas (“És um inútil!”; “Sou me dás dores de cabeça”; “Apenas sofro isto por tua causa”; “És feia(o)”) que ouviram e repetem vezes sem conta no seu dia à dia. É como ser o torturador e a vítima em simultâneo! Um sofrimento atroz, que pode ser alterado se estivesse focado no presente!
A alegria é uma emoção que coexiste com a tristeza e a raiva. No entanto, o sentido que atribuímos à uma experiência vivida está relacionado com o valor que damos ao passado e ao futuro. Este movimento que surgiu “Viver o Agora”, já existe desde os tempos dos grandes filósofos gregos, mas parece um absurdo para quem tem uma vida acelerada e ditada pelos costumes e tradições. A tradição com a sua origem no latim “traditio”, que significa entregar, dar continuidade, aliada aos costumes que são inicialmente praticas que com o tempo passam a obrigações. O que impõe um peso na pessoa que está inserida na sociedade onde esses costumes e tradições existem. Ser uma boa pessoa, ser um bom marido, ser um bom filho, nem sempre está alinhado com os costumes que sociedade impõe. Aqui é importante a pessoa avaliar o que quer para si, para a sua vida. O objectivo que cada um tem para si é muitas vezes confrontado com as expectativas, criadas pelos outros, sustentadas pelas elaborações sociais, culturais e por fim, familiares.
A alegria está nos detalhes diários, observar os detalhes exige uma atenção que nem todos estão dispostos ou com abertura para essa actividade. Ver os pardais a saltitar, o riso genuíno de uma criança, o olhar terno e mútuo de um casal de idosos são panoramas que quem está fechado no passado ou no futuro incerto, considera triviais e até ignora valorizando apenas os seus problemas. Mas eles fogem? O fato de observar um momento de alegria faz esquecer os problemas? Realmente não os soluciona, mas aliva o tormento e cria ligações de empatia. Claro está que quando estamos tão fechados, utilizamos a amargura de “Isso interessa-me?”. São aquelas pessoas que perante um quadro reparam no pó e não na intenção! É o famoso “Tão querido!” quando uma criança dá um desenho seu, e a pessoa esquece-o numa gaveta, porque não é estético! É o famoso “Parabéns por ter comprado esse vestido!”, e mal a pessoa vira costas ridiculariza o padrão, ou a forma da indumentária! Não admira que agora os títulos dos bestsellers, contenham palavras obscenas, os autores dão aquilo que o leitor quer, certo?
Culpamos a sociedade pela hipocrisia e valorização de bens materiais para ter felicidade, no entanto nunca paramos para olhar para nós e observar o que nós podemos fazer para alterar este ciclo.
Que este seja o ano, o momento que sinta Agora! Recorra ao ouvir, sentir, saborear tudo aquilo que tem! Afinal o que tem é o Agora! Porque não basta dizer que é boa pessoa, é preciso querer e aceitar que é boa pessoa!