EDITORIAL Nº 677 – 15/1/2016

SR

Caro leitor,

Celebra-se em 2016 o ano da Misericórdia. Sendo esta uma palavra chave, poucas pessoas param para pensar no seu significado. Ora seguem algumas palavras em jeito de definição: “compaixão, piedade, perdão”. É o ato de conseguirmos ver e sentir a dor alheia e, quando o fazemos, também a capacidade de perdoar nos vem naturalmente. É um sentimento contrário a julgamentos, distanciamentos, rejeições e indiferenças. É, portanto, um sentimento inclusivo e solidário, como poucos se caraterizam.
O homem não se define em si, mas pelo conjunto das suas influências noutros, sempre positivas e negativas. Nisto, podemos ser alvo de introspeção e realmente divagar acerca da nossa influência positiva e o papel da misericórdia no apoio a terceiros. A oração é uma das formas. A conversa com Deus a respeito daquilo que pensamos, que sentimos, que fazemos revela muito de nós mesmos no processo. Revela também a nós, quem somos.
Com esta idade, cinquenta anos após a minha infância, recordo com saudade os tempos em que era miúdo, só um miúdo, cujas preocupações eram efémeras e vivia sabendo perfeitamente quem era. Fica a saudade dessa vida longínqua. Mas mudam-se os tempos e mudam-se as vontades. Na altura, rezava-se à noite em família, sempre ao fim da ceia, e agradecíamos a Deus os frutos do dia de trabalho. Valorizava-mos todas as posses e produtos que vinham do nosso trabalho.
Os meus Pais exigiam que, ao escurecer, os cinco filhos estivessem em casa. Vi algumas vezes os meus irmãos mais velhos a serem castigados porque gostavam de ficar no largo da santinha, à conversa com pessoas de mais idade. Ouviam-se anedotas e contavam-se histórias. Eram as melhores noites, diziam.
Ao mesmo tempo, o meu pai rezava na cama. Lembro-me até hoje de uma das orações: “- Além vai Jesus. - Que lhe quereis vós. - Quero ir com ele, que me leva à cruz. Seus braços abertos, seus pés encravados, remando o seu sangue por nossos pecados. Pai nosso e Ave Maria”.
As memórias são as coisas mais preciosas que temos e em desabafo ganham de novo vida. Com a correria da vida, com o trabalho, a escola, os deveres, a cama e o televisor, esquecemo-nos amiúde que o que deixaremos de mais importante serão as obras e o bem que deixarmos neste mundo. É isto que perdurará nos tempos e nos nossos. O resto, do pó ao pó voltará.

Um abraço amigo,