TEMPO SECO

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Bailundo Minha Paixão
Quis o feliz acaso que no retorno a Angola, fosse parar ao Bailundo. Sempre evoquei que Angola é a terra do meu coração. Muitos pensam que é um desabafo como justificação de tal expressão. Todavia, a realidade é bem diferente e eu sempre fui mais feliz, nestas terras africanas, que na terra onde nasci. O livre arbítrio, se existe, não é pleno, e se não podemos escolher onde nascer, deveríamos, pelo menos, poder decidir onde morrer.
Bailundo é uma cidade média, no contexto angolano. Situada na província do Huambo dista cerca de 75 Km de Huambo cidade. Terra acolhedora de gente laboriosa, corajosa, com muito afecto e arreigada às suas ancestrais tradição. O Bailundo sempre foi assim: cordial, destemido e sofredor. Daí, que tenha sido um dos reinos angolanos que mais se evidenciou na resistência à ocupação colonial, e foi também uma das regiões mais fustigada pela guerra civil, que durante quase trinta anos flagelou Angola.
É talvez a região de Angola, aquela que mais me tocou na alma e por quem nutro uma profunda paixão. Não era por acaso que gracejava com, a então, Administradora Municipal Edith, e lhe dizia: - que por este amor consentido, deveria ser distinguido como cidadão honorário do Bailundo-. Contudo, o que dizia era a brincar mas, o sentimento é genuíno… Isso garanto eu.
Um pouco afastada da cidade, situa-se a Missão Católica da Hanga. Não é para falar da missão em si mas, do orfanato que está sob tutela desta missão, e onde são acolhidos uma boa parte dos órfãos da região. Aqui têm o seu lar, a sua escola e a assistência sanitária, dentro da intervenção que é possível exercer, e muito limitada pelas adversidades próprias, de contingência geral, vividas naquele país.
Apesar do infortúnio da vida dos meninos que lá são acolhidos, e das próprias carências de subsistência diária, todas as vezes que me desloquei àquele local, não vi ninguém infeliz. Todos se ocupavam das suas tarefas e das suas brincadeiras quotidianas, com a maior felicidade e alegria estampadas nos seus rostos. Numa percepção evidente de que não é preciso muito para ser feliz. Dava gosto vê-los assim. A sua alegria era contagiante, e ninguém de lá saía triste, bem pelo contrário. A irmã Maria, chefe do orfanato, bem como outras irmãs, cujo nome já não recordo, tratavam--os como dedicadas mães tratam os seus filhos. Talvez a opção de vida religiosa que tomaram tivesse esse sentido de vida, e tinham neles os seus próprios filhos.
Ninguém me pedia nada… Mas, sempre que lá ia contribuía com um pequeno donativo, ao alcance das minhas possibilidades. O pouco que dava, em nada se comparava com o muito que recebia. Nesses momentos pensava: no que muitos esbanjavam, na vã tentativa, de obterem a felicidade. A felicidade não se compra. Ali estava o melhor testemunho desse facto: com tão pouco… E tão felizes!... Que grande lição de vida aqueles meninos nos ensinam. Ás vezes exibimos grandes argumentos selectivos e imprudentes, esquecendo, um pouco, aquilo que deixamos para trás.
Um bom Natal para todos.