A PRODUÇÃO DE MIRTILOS NO CONCELHO DE MANGUALDE

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A produção de frutos vermelhos, particularmente o Mirtilo tem vindo a crescer substancialmente no concelho de Mangualde.
Para conhecermos e darmos a conhecer aos nossos leitores como se desenvolve a produção destes pequenos frutos, que nesta época do ano criam muitos postos de trabalho, falámos com Rui Costa, Presidente da COAPE, cooperativa que detém a fileira do Mirtilo no concelho e é já uma referencia no estrangeiro.
RENASCIMENTO - COAPE, Cooperativa Agro-Pecuária dos Agricultores de Mangualde. Como é que se constituiu e desenvolveu em Mangualde?
RUI COSTA - A COAPE vem no seguimento da antiga cooperativa dos olivicultores de Mangualde, que foi assim que se chamou inicialmente e, também da posterior fusão que os grémios da lavoura tiveram com as cooperativas, em 1978. Nesse ano, é constituída a COAPE e em 1979 a cooperativa dos olivicultores entra nela como uma secção. O grémio da lavoura entra igualmente como outra secção. Seriam posteriormente a secções da COAPE, como a secção de compra e venda. A secção de olivicultores da COAPE ainda existe, no ponto de vista estatutário, mas é uma secção muito pouco ativa, tem poucos associados já ligados à secção e enfim não há grandes expectativas de que possamos vir a reabilitar, para já. Mas é assim que surge a COAPE em 1978.

RENASCIMENTO - Quais são as suas principais atividades? Desapareceu praticamente a olivicultura, mas vão surgindo outras?
RUI COSTA - Entretanto, em 1978 é constituída a COAPE com duas secções, a secção de compra e venda que era o antigo grémio da lavoura e a secção de olivicultores, foi assim durante muitos anos, até que eu e a minha equipa entramos nesta cooperativa, no ano de 2010. A partir daí nós constituímos uma cooperativa multi setorial, com a criação de novas secções, nomeadamente a secção dos pequenos frutos que é a Mberrys, a secção centro de inovação e desenvolvimento que é a CIDECA e também, agora, recentemente, a secção de OPleite para a recolha e produção de leite de ovelha de raça bordaleira. Portanto, criamos estas 4 novas secções com as quais estamos a trabalhar intensamente. Conseguimos catapultar esta cooperativa para uma dimensão nacional e internacional, através da Mberrys, mas, igualmente, da formação. Nesta dimensão, somos uma entidade certificada no âmbito dos cursos do setor primário, aplicador de fitofármaco, manobrador de maquinas agrícolas, produção integrada, em todas as áreas ao setor.

RENASCIMENTO - Fez referência à intervenção da COAPE nos Mberrys, que é a produção do Mirtilo. Como é que a COAPE realiza essa intervenção ?
RUI COSTA - Esta fileira vem no seguimento daquilo que foi um trabalho de prospeção e investigação por parte, em 2012/13 , da direção da nossa cooperativa. Fizemos várias incursões ao estrangeiro no sentido de perceber o que é que era isto da produção dos pequenos frutos, pois, conhecíamos, aqui, a realidade de Sever do Vouga, bem próximo de nós. A aqual tinha uma fileira que era bastante interessante, da qual as pessoas falavam muito bem. Entretanto, a nossa primeira preocupação foi a da questão do escoamento, como é que poderiamos escoar uma produção que apontávamos para a proximidade das mil toneladas ano. Conseguimos faze-lo através de um protocolo com uma entidade que está situada no sul de Espanha, a Euroberrys. Esta garantia-nos todo o escoamento da produção. A partir daí, promovemos e desenvolvemos a fileira, a qual foi sustentada no antigo programa do PRODER, do quadro comunitário. Captamos imensos jovens, sobretudo jovens agricultores, os quais fizeram as suas candidaturas para a instalação dos seus projetos e exploração dos mirtilos.

RENASCIMENTO - Onde é que a COAPE possui, no concelho de Mangualde, os terrenos para a sua produção?
RUI COSTA - A COAPE é o elo de ligação dos seus produtores. Nós, a COAPE, efetivamente, não tem nenhuma exploração direta de Mirtilos. Todos os campos de Mirtilos pertencem a jovens agricultores e a projetos, entretanto a COAPE já adquiriu algumas explorações de jovens que foram abandonando, as quais, hoje, são propriedade dela. Os ativos dessas explorações já são propriedade da COAPE.

RENASCIMENTO - Quais são as espécies de cultivares de Mirtilo que utilizam na produção de Mirtilo?
RUI COSTA - Nós tivemos a preocupação de acautelar alguns problemas que pudessem vir a surgir posteriormente, nomeadamente a questão da mão de obra que é um fator fundamental para o sucesso da fileira, então, com base no knowhow dos nossos parceiros foi-nos sugerido que os nossos campos fossem todos montados para termos três variedade, as precoces, as intermédias e as tardias. Este processo permite-nos que a produção não se fixe toda num tempo estreito, num período muito estreito de tempo, e, portanto, consegue-se levar a produção dos finais do mês de maio até finais do mês de setembro. Dividimos o campo em precoces, intermédias e tardias. Assim, surgem, em primeiro lugar, as precoces, com variedades de Duke Legacy, Draper, Blue Crop. Todas elas são variedades precoces, que significa que são as primeiras a ter fruta madura. Depois seguem-se as intermédias, que são a Ozarkblue, Liberty, Chandler e Brigita. Finalmente, as tardias que são a Centrablue, Aurora, Lastcol, Ochoclok, quer dizer há uma panóplia de variedades.

RENASCIMENTO - Os rendimentos são os mesmos, ou variam de cultivare para cultivare?
RUI COSTA - Varia muito. O mercado paga a fruta à semana. É tipo de uma bolsa que existe na europa e que estabelece o preço de mercado. Por isso, nós vamos tendo conhecimento do preço que se vende à semana. Sabemos que há períodos em que a fruta é muito mais bem paga do que outros e portanto tivemos o cuidado de distribuir a produção por todo este período.

RENASCIMENTO - Porquê?
RUI COSTA - Porque a cadeia comercial exige fruta todo o ano. Não exige fruta só uma ou duas semanas, portanto, o que eles querem é ter fruta todo o ano e quanto mais fruta tiverem melhor.

RENASCIMENTO - Em referência ao que está a dizer, captamos que a produtividade do Mirtilo está de acordo com o tipo de terreno e de temperatura, mas, sempre, com o objetivo de o manter durante um período alargado de tempo? É verdadeira esta conclusão?
RUI COSTA - Certo, sim! Mas estes cultivares são tudo Mirtilos do norte, chamam-se Highbush, significa que são tudo plantas que têm que ter no mínimo 700 horas/800 horas de frio. Isso significa que no período anterior tem que se desenvolver com 700 horas de temperaturas abaixo dos 7 graus. Essas plantas, aqui, dão-se muito bem. Nós temos essas temperaturas. Temo-las de dezembro até fevereiro. Há muitas noites em que há temperaturas abaixo de 2o, 3o, 4o e, portanto, cumprimos essa exigência e temos, também, um terreno correto para isso com PH muito estável nos valores de 5.5, o que é o ideal para a produção desta fileira. Mais: o fundamental é ter água, porque é uma planta que consome muita água.

RENASCIMENTO - Qual é a quantidade de água?
RUI COSTA - Estamos a falar num pico de 4 litro de água por planta/dia.

RENASCIMENTO - A produção das referidas plantas têm aumentado de ano para ano ou está estacionária?
RUI COSTA - Sempre a aumentar, todos os anos. De ano para ano estamos a aumentar, felizmente. Estamos a aumentar quer em número de cooperantes quer em quantidade de volume de produção por ano, o que é bom para a fileira, porque ganhamos aqui alguma escala. Esta traz-nos alguns benefícios nos termos da redução de custos. Essa é a lógica, trabalharmos em escala, em cooperativa, de forma a podermos baixar custos de produção, porque aí é que está o nosso ganho.

RENASCIMENTO - Em que quantidades de produção podemos falar?
RUI COSTA - Podemos falar em média, 10/12 toneladas por Ha.

RENASCIMENTO - E quantos hectares é que têm?
RUI COSTA - Nós temos aproximadamente perto de 100 hectares.

RENASCIMENTO - Já é entusiasmante a produção?
RUI COSTA - Já! Já é muito bom. A nível nacional, temos grande destaque, grande relevo na produção de Mirtilo. A nível internacional, não. Conhecemos agricultores, que só eles têm a área toda, a que atrás citei, de produção de Mirtilos. Esta situação verifica-se em Espanha e Polónia.

RENASCIMENTO - A produção estendeu-se nos últimos anos no concelho de Mangualde a outros produtores?
RUI COSTA - Sim.

RENASCIMENTO - São muitos os produtores de Mirtilo?
RUI COSTA - São. São muitos de facto.

RENASCIMENTO - Desenvolve uma boa relação, enquanto Presidente da direção da COAPE, com os produtores de Mirtilo? As coisas estão a funcionar bem?
RUI COSTA - Falamos de jovens agricultores, os quais apresentam os seus projetos, e têm o apoio da COAPE. Esta mantém a liderança associativa ou cooperativa como lhe queiramos chamar. Essa relação tem boa eficácia, está bem no terreno.

RENASCIMENTO - Não há conflitos, não há desinteresses?
RUI COSTA - Vamos lá ver. Nós estamos num patamar de exigência, no ponto de vista da produção desta fileira, muito elevado.

RENASCIMENTO - O que é quer dizer?
RUI COSTA - Muitas das vezes, os conflitos que surgem têm muito a ver com algum amadorismo que muitos dos nossos produtores têm. Eu, nomeadamente, sou também produtor de Mirtilos, mas, no meu ponto de vista, considero-me amador. Às vezes, sinto que tinha que me dedicar com mais intensidade e com mais profissionalismo à exploração de Mirtilos. Esta auto-perceção que eu vivo, acontece com todos ou quase todos os nossos cooperantes. Temos muito bons produtores, já muito profissionalizados , e os que têm isto como um hobby de vida, dedicando-se a tempo inteiro à produção. A maioria é uma segunda atividade. Portanto, daí é que surgem os conflitos, nomeadamente , com o ponto de vista de exigência, das certificações, da qualidade da fruta. Com todos esses requisitos, mas que, em relação aos quais, vamos, ano após ano, melhorando. Ultrapassamos, assim, as nossas próprias dificuldades. Trabalhamos, sempre, juntos. Reunimos, várias vezes, com todos os produtores, para identificarmos e sentirmos as nossas dificuldades, de forma a desenvolvermos estratégias comuns para as ultrapassarmos.

RENASCIMENTO - Tem havido muitas desistências?
RUI COSTA - Não. As desistências que tem havido é exatamente por consequência daquilo que acabei de lhe dizer, pois, muitos deles não conseguem acompanhar o ritmo dos outros, ao nível da aplicação e das exigências de certificação . Dos planos de fertirega, de todo este trabalho que está associado à produção. Ao não acompanharem, dizem: “...não aguento, prefiro sair” Perceba-se, para estarem connosco têm que trabalhar com determinado caderno de encargos, para ter qualidade, para ter sucesso, tem que ser assim. Doutra forma, vale mais não estarem connosco e procurarem outras respostas, que há aí “fora”, para escoarem a sua fruta.

RENASCIMENTO - É nessa, ou através dela, atitude que vocês estabelecem a vossa relação com os produtores de Mirtilo?
RUI COSTA - É. É nessa atitude.

RENASCIMENTO - Podemos afirmar de acordo com o que nos está a partilhar connosco que há muitos produtores de mirtilo em Mangualde?
RUI COSTA - Sim, podemos afirmar. Há muitos produtores de Mirtilo, no concelho de Mangualde.

RENASCIMENTO - A COAPE teve alguma influência nesse processo?
RUI COSTA - Teve toda a influência, aliás, a fileira foi lançada por nós, COAPE, e, felizmente, que o fizemos. Entretanto, já apareceram muito mais organizações, ligadas ao Mirtilo.

RENASCIMENTO - No concelho de Mangualde?
RUI COSTA - Sim, sim, no concelho de Mangualde e que tiveram como génese a COAPE. A COAPE esteve na génese de todo este impulso, o da região centro.

RENASCIMENTO - Há competitividade com essas organizações e/ou há, também, uma relação de convívio?
RUI COSTA - Não, há uma boa relação entre a COAPE e os outros colegas, os ligados ao setor do escoamento do Mirtilo. Não, não há conflitos nenhuns, até pelo contrário, sempre que precisamos uns dos outros, estamos disponíveis para resolver problemas. Nos quais, às vezes, há dificuldades de escoamento, por um motivo ou por outro. Contudo, há, sempre, uma abertura entre todos.

RENASCIMENTO - Em relação à exportação do produto, a maioria é exportada?
RUI COSTA - O produto é 100% exportado.

RENASCIMENTO - Como é que vocês fazem a seleção do produto? Qual foi a estrutura que criaram para desenvolverem esse processo?
RUI COSTA - Numa fase inicial, tínhamos uma estrutura amadora. No entanto, felizmente, o território de Mangualde tem, outra grande cooperativa, que é a cooperativa agrícola de Mangualde, mais conhecida por estação fruteira de Mangualde ali na zona de Moimenta de Maceira Dão. No sentido das boas relações que temos com todas as cooperativas do nosso território, que aqui sublinho, criamos um protocolo com a cooperativa agrícola de Mangualde, para podermos usufruir das suas infraestruturas, para localizar lá o nosso centro de processamento.

RENASCIMENTO - O que é constitui o centro de processamento?
RUI COSTA - É o local onde os nossos produtores entregam a fruta colhida. Agora, durante todos estes dias, desde a ultima semana de maio, temos todos os dias os produtores a entregar fruta na cooperativa agrícola de Mangualde, no nosso centro de processamento.

RENASCIMENTO - Como é que se organizou esta situação?
RUI COSTA - Nós protocolamos com eles, com a cooperativa agrícola de Mangualde, disponibilizaram-nos 4 câmaras de frio e nós trabalhamos nessas 4 câmaras de frio o nosso centro de processamento durante 3 meses, 3 meses e meio. Achei por bem fazê-lo, porque entendo que devemos partilhar as sinergias, que temos, uns com os outros, e não andarmos aqui a alavancar novas estruturas, novos investimentos no território, sabendo que existem boas condições de trabalho. Por isso, tivemos que chegar só a um entendimento, que foi o que aconteceu. Estabelecemos um entendimento com a cooperativa da maçã, com a utilização de um dos seus edifícios, onde trabalhamos o nosso processamento, o do Mirtilo. Portanto, a primeira fase é a fase da colheita em campo, no qual os produtores têm que reunir os seus colhedores de fruto. Aí é dada uma formação, a todos, no sentido de saberem quais são a regras e de que forma e em que condições se pode colher a fruta. A partir daí, o produtor, sempre que recolhe a fruta, imediatamente trá-la para as câmaras de frio. Ao entrar nas câmaras de frio, a fruta é colocada numa máquina processadora. É um investimento nosso, que realizamos, recentemente, com custos na ordem dos 400 mil euros. É uma máquina que faz seleção do fruto, através de dois sorter’s, um faz com base na cor. Se não estiver azul, significa que o Mirtilo não está madura. O outro seleciona com base na dureza do fruto. Faz essa escolha, a pesagem, o embalamento no formato que o cliente quer. Ora, nós processamos, embalamos, colocamos o rótulo do cliente final, se vai para o Reino Unido , para França, ou se vai para a Holanda. No final, paletizamos. E às segundas, quartas e sextas vêm sempre os camiões carregar as paletes de fruta, que levam para o destino final.

RENASCIMENTO - Essa estrutura, constitui uma unidade de seleção de produto?
RUI COSTA - Sim, seleção, armazenamento, paletização.

RENASCIMENTO - Há todo um conjunto de pessoas que dão apoio a todo esse processo, com a participação de técnicos especializados?
RUI COSTA - Sim, temos duas engenheiras agrónomas a trabalhar diariamente na secção dos Mirtilos, durante todo o ano.

RENASCIMENTO - E do resultado desse trabalho, surge algum feedback dos produtores?
RUI COSTA - Eu considero que o feedback que recebemos é muito positivo, porque se não fosse assim não tínhamos gente a querer entrar todos os anos para a nossa fileira. Temos, cada ano que passa, mais candidatos a quererem nela entrar. Essa atitude, segue-se ao feedback muito positivo que temos e que é do conhecimento comunitário. Recebemos o melhor feedback que poderíamos ter. O facto de termos muito pouca gente a abandonar a nossa fileira, é muito importante. Nunca tivemos ninguém a abandona-la porque achasse que a COAPE trabalha mal. Não, saíram porque não conseguem acompanhar o ritmo da COAPE.

RENASCIMENTO - Podemos falar de uma cooperativa de produtores de Mirtilos?
RUI COSTA - Não, não, porque a grande massa de associados, não está na Mberrys, está na secção de compra e venda. A secção de compra e venda tem 4900 associados.

RENASCIMENTO - O que é a Mberrys?
RUI COSTA - A Mberrys é a fileira só dos Mirtilos. A COAPE está dividida em secções. Pode ser cooperante só numa secção. Pode ser só produtor de Mirtilos, então só está ligado a esta secção. Por esse motivo, não está ligado aos produtores de leite, não está ligado a secção e compra e venda e não está ligado à secção de formação profissional.

RENASCIMENTO - E os produtores de Mirtilos estão ligados a que secção?
RUI COSTA - Mberrys, pequenos frutos.

RENASCIMENTO - Então, não é uma cooperativa é uma secção da COAPE?
RUI COSTA - É. É uma secção da COAPE.

RENASCIMENTO - E tem futuro essa secção, pode vir a ter futuro?
RUI COSTA - Sim, eu acho que sim, a Mberrys tem muito futuro. Estamos a falar dum fruto que ainda não é comum na mesa dos portugueses, ou no mercado do sul da europa. Os portugueses, italianos, espanhóis, ainda não têm o hábito de comer Mirtilos todos os dias, ao contrário daquilo que os países do norte da Europa, do Canadá, dos Estados Unidos, fazem. Estes consomem diariamente Mirtilos há muitos anos. Nós é um produto, em que a procura aumenta de ano para ano, mas também a oferta aumenta de ano para ano. Há muitos países a produzirem Mirtilos. Aqui, os nossos vizinhos espanhóis, italianos, polacos, estão a investir muito na produção de Mirtilos . Constituem, assim, os nossos grande concorrentes.

RENASCIMENTO - Será que isso tem a ver também com a temperatura e tipo de solo desses países?
RUI COSTA - Tem a ver com a janela de oportunidade. Constatamos que o mercados dos pequenos produtos está instalado em termos de planeta. Temos uma produção no hemisfério sul, que vai de dezembro, janeiro, fevereiro, a qual, nessa altura, produz e fornece todo o mundo. Depois, temos o mercado do norte de África/Marrocos, e o sul de Portugal e sul de Espanha que também entram nesta etapa, influenciados pelo clima, pois, conseguem ter produções, logo, no início de março. Nesse mês, já temos o Algarve, a Costa Vicentina e o Alentejo a produzir Mirtilio. A seguir, a partir de junho entram os países da Europa. O norte de Portugal, o norte de Espanha, a Polónia e a França. Todos os países que estão mais a norte tem as produções nesta janela de oportunidades. Nós temos aqui um fator positivo, o de conseguimos levar a fruta até finais de setembro, princípios de outubro, o que já não acontece com a Polónia, que tem temperaturas muito baixas e, portanto, já não consegue ter essa produção nessa época. Nessa opção , nós, ainda, conseguimos manter a produção de Mirtilo. Constitui-se, assim, como um fator determinante no preço, porque nessa altura do ano não há muito Mirtilo

RENASCIMENTO- Portugal está a competir , a nível da Europa, com que países?
RUI COSTA - Com a Espanha, com a Polónia e também, a Itália.

RENASCIMENTO - Pode dizer-nos alguma coisa sobre o Mirtilo português? Os cultivares podem ser os mesmos? O produto final é o mesmo, verdadeiramente, do que é produzido, por exemplo, numa Polónia?
RUI COSTA - Vamos ver, depende das variedades. Nós trabalhamos com um grupo que é o maior player mundial de Mirtilos, que é a SAT hortifrut. Uma entidade chilena que domina o mercado do Mirtilo. Não é da framboesa, é só do Mirtilo. Tem variedades próprias do grupo. Nós sabemos, no caso SAT hortifrute e da Driscoll`s, outro grande player nos frutos vermelhos, produzem as próprias variedades, têm o royalti da variedade.

RENASCIMENTO - Essas empresas são chilenas?
RUI COSTA - Uma é do Chile, a SAT hortifrut, a outra, a Driscoll`s, é americana, e, portanto, são os grandes players mundiais na área dos berryes. Eles têm berryes todos os dias do ano. Há uma altura em que somos nós, Portugal, que estamos a alimentar essa industria. Somos nós que estamos a produzir e eles é que estão a vender. E há-de haver uma altura que é Marrocos, outra altura que é o Brasil. Outra há-de ser a Argentina, o México, o Perú. Eles têm várias explorações, por todo o Mundo. Muitas das explorações são próprias deles. Portugal é aqui um nicho, em que eles nos acolheram. E sendo uma cooperativa com pequenas áreas, mas muitos produtores. Em contraste, eles são poucos produtores com grandes áreas. Todos com quintas de 200, 300, 1000, 1500 hectares. Nós estivemos, nos Estados Unidos da América do Norte, numa quinta, com 1500 hectares, situada na Califórnia. Tem temperaturas idênticas às nossas. Tem lá a Universidade Orgon, a qual tem uma maiores especialistas do mundo de Mirtilos, que é a Drª. Bernardine. Nós tivemos o privilégio de termos a sua presença no Sétimo Encontro Nacional de Produtores de Mirtilo, que se realizou em Mangualde.

RENASCIMENTO - Esse encontro realizou-se em Mangualde. Em que data é que aconteceu?
RUI COSTA - Foi há dois ou três anos atrás. Foi no complexo paroquial, foi qualquer coisa de extraordinário, estava a sala completamente a abarrotar.

RENASCIMENTO - Com esse evento, constata-se, hoje, alguma melhoria na vossa própria capacidade de resposta, de mobilização de liderança?
RUI COSTA - Sem dúvida. Repare que nós no patamar em que nos situamos, hoje, temos a facilidade de falar com os melhores especialistas do mundo de Mirtilos. Nós quando temos problemas e os queremos resolver temos a felicidade de ter essas portas abertas, seja no EUA, seja no Chile, seja em Espanha, seja em Itália. Trabalhamos com eles, para percebermos as dinâmicas da evolução do Mirtilo, nos seus diversos sectores, desde a sua produção até à comercialização.

RENASCIMENTO - A evolução do Mirtilo no concelho de Mangualde deve-se a essencialmente a que os fator ou factores?
RUI COSTA - Dois grandes fatores. O primeiro, foi o grande impulso da COAPE, ao lidwerar um projeto inovador na região. O segundo, muito grande, foi o facto dos projetos do Mirtilo serem financiados pelo PRODER.

RENASCIMENTO - Não tem, também, a ver com a própria capacidade de adaptação ambiental do próprio Mirtilo?
RUI COSTA - Sim, também tem. Nós temos outras culturas que, igualmente se dão aqui lindamente, mas que ainda não deram o impulso verdadeiro de implementação e afirmação.

RENASCIMENTO - O debate do Mirtilo é muito interessante?
RUI COSTA - Sim, é muito interessante. Eu diria que é uma fileira que vai crescer muito, vai-se profissionalizar. Os que ficarem como produtores, vão-se profissionalizar, vão aumentar as suas áreas de exploração. Uma grande parte vão desistir, vão ficar apenas como amadores. Este é o caminho que tem que ser feito. temos que levar isto muito a sério, porque o mercado é muito exigente. É muito negativo para nós, quando trabalhamos para exportação, mandamos 10 paletes de Mirtilo para França e depois serem devolvidas, porque não têm qualidade. Ninguém quer isso e, portanto, temos que ser muito rigorosos, muito exigentes. As pessoas têm que perceber isso. Nós trabalhamos num modo de cooperativa, em que se divide os custos e as receitas. Tudo é partilhado com os produtores. Se andarem, aqui, três ou quatro a estragarem, todos serão penalizados por esses mesmos três ou quatro. Portanto, essa situação, funciona um bocado como pressão sobre as pessoas, de forma a serem mais exigentes com e no seu trabalho e não estragarem o dos outros, com os seu desleixo. Toda a gente, de acordo com um padrão tipo de acção-pensamento “tem que sentir que tem que trabalhar”, porque o produto é resultado da participação nele de toda a gente. Por isso, há que rentabilizar os custos da rentabilidade interativa, ou mais propriamente, a cooperativa. Há essa lógica, que na base é de cooperação. Assim, nós não pagamos à semana, nós pagamos à média da campanha, porque sabemos que há semanas que o Mirtilo tem o preço muito baixo, mas há semanas em que o Mirtilo tem o preço muito alto, portanto, se nós fossemos pagar à semana havia semanas que ninguém queria, perdia dinheiro.