Arquivo mensal: Novembro 2019

Mangualde recebeu Presidentes das Câmaras de Comércio e Indústria da França, Suíça e Luxemburgo

Com o objetivo de impulsionar a internacionalização das empresas mangualdenses, bem como a captação de investimento direto estrangeiro para Mangualde, o Município de Mangualde recebeu, nesta edição da Feira dos Santos (dias 2 e 3 de novembro), alguns presidentes da Rede das Câmaras de Comércio Portuguesas, nomeadamente: Carlos Vinhas Pereira (Câmara de Comércio e Industria Franco - Portuguesa), Francis da Silva (Câmara de Comércio e Indústria Luso - Luxemburguesa) e Marina Prévost-Mürier (Câmara de Comércio, Indústria e Serviços Suíça - Portugal).
As Câmaras de Comércio Portuguesas assumem a qualidade de eixo funcional e interativo entre os agentes económicos e representativos do associativismo empresarial da Diáspora. Paralelamente ao programa comum do certame, tiveram lugar algumas reuniões de trabalho, destacando-se as realizadas com empresários locais, onde se procurou promover o nosso concelho e a qualidade das nossas empresas com resultados muito satisfatórios.
Na opinião dos vários empresários locais, as reuniões tidas com estas entidades, que identificam como a ponte de ligação para a internacionalização da economia mangualdense, revelaram-se bastante profícuas e produtivas. Já os Presidentes das Câmaras de Comércio e Indústria atestaram que consolidado pelo seu empreendedorismo e indústria, com áreas de grande potencial competitivo, Mangualde está bem posicionada para o estabelecimento de relações comerciais e industriais com as suas regiões.
Para João Lopes, Vereador da Câmara Municipal de Mangualde, esta iniciativa permitiu “fomentar sinergias e possibilitou o desenvolvimento da rede de contactos e relações profissionais, bem como possibilitou mostrar aos diversos Presidentes das Câmaras de Comércio o que Mangualde tem de melhor na área industrial e nos produtos endógenos”.

100 ANOS DE VIDA MANGUALDE CONTA COM MAIS UMA CENTENÁRIA

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Nasceu em Santiago de Cassurrães em 13 de novembro de 1919. Completou há dois dias um século de vida.
Franzina e bem disposta, assim fomos encontrar a D. Ana de Jesus Almeida, no Lar Morgado do Cruzeiro em Mangualde, onde se encontra como utente há 3 anos.
A sua longa vida, foi sempre dedicada ao trabalho e à criação dos seus quatro filhos, os Srs. Luís Martins, D. Amélia Martins, Joaquim Martins e Mário Martins.
Com alegria, além dos filhos, vê nos seus 7 netos, 13 bisnetos e 8 trinetos a continuidade da sua família.
Na companhia dos filhos D. Amélia e Sr. Mário, a D. Ana contou-nos algumas peripécias da vida que pela sua memória iam surgindo, salientando sempre, o muito trabalho na Quinta da Tapada Nova no trato das ovelhas e do queijo, que garantiam sustento à família.
“Uma vida comprida e custosa”, referiu a D. Ana.
Para assinalar a bonita efeméride, a família, como habitualmente, veio ter com ela ao Lar e em conjunto com os outros utentes, foram cantados os parabéns e apagadas as velas.

EDITORIAL Nº 764 – 1/11/2019

patrao
Caro leitor,
Em altura de eleições todos os problemas do País vêm ao de cima. Nestas últimas eleições o maior foco foi o ambiente e a desertificação.
Sabemos que em Portugal, 60% da população vive na orla costeira. Em Lisboa 2,8 milhões de pessoas e no Porto 1,7 milhões. Ora se aqui se concentra o maior número de habitantes, logo é aqui que se produz a maior riqueza do nosso país. E esta bola de neve não pára. Cada um procura a melhor forma de viver e ser feliz. Um dia perguntei a um amigo como era viver em Lisboa em relação a Mangualde. A resposta dele foi rápida e concisa “Em Lisboa é tudo mais: ganha-se mais, caminha-se mais, corre-se mais, come-se mais e gasta-se mais. Mas ar puro é cá em cima em Mangualde”.
Já vivi no Algarve, em Portimão, e já tive casa na praia. Ainda tenho património à beira-mar, mas não tem este ar puro de Mangualde. É aqui que sou feliz. Viver no interior não é, nem tem de ser, uma fatalidade.
É claro que não há respostas simples, e não podemos cair na tentação de adoptar perspectivas redutoras, leiam-se negativas. Sabemos que os diagnósticos estão feitos e que existem mecanismos de estima à fixação de pessoas no interior pois estamos a 100Kms do nosso mar; 100 de Espanha; 280 Kms de Lisboa; 170 do Porto e 450 de Madrid. Mas é neste interior que nós nos queixamos e tem de haver coesão territorial, económica e social e olharmos para as questões demográficas. É imperativo termos em conta o elemento fundamental e fundador de origem: as pessoas.
Só há renovação dos recursos, preservação e integridade territorial se houver capital humano. Mais, já digo há algum tempo, é urgente e importante o emparcelamento de terras, assim com belgas e arretos não há fixação de pessoas.

Um abraço amigo,

Quando a Nata da Sociedade azeda….

Ana Cruz
Numa sociedade cada vez mais alicerçada no conceito social e na ideologia “Todos diferentes, todos iguais”, poderia ser considerado politicamente (in) correto um discurso que inclui o termo “Nata da Sociedade” por parte de um líder…. Afinal se todos somos importantes na diferença que detemos, porquê afirmar que a “nata” é melhor que o “leite”? A metáfora é até bem interessante porque qualquer pasteleiro\ cozinheiro\ dona de casa, enfim qualquer pessoa que lide com culinária, conhece bem a origem da nata…. Trata-se da porção de gordura do leite que permanece a flutuar quando o leite fresco está em repouso; passa por centrifugação ou fervura. Possivelmente os filhos da “Nata da Sociedade”, desconhecem este processo porque consideram que o “leite de pacote” já vem processado desta maneira desde a origem, mas felizmente os filhos dos pastores,- que não pertencem à mesma categoria dos anteriores - são mais esclarecidos e não dão respostas tipo “De onde vem o leite? Vem do supermercado!” em tom jocoso.
Perante este esclarecimento acerca deste subproduto do leite, podemos colocar esta indagação: Será que quando alguém se conota por pertencer á “Nata da Sociedade”, refere à questão da gordura (termo pejorativo para caraterizar alguém. Por exemplo “Olha vem aí o gorduroso, porque é da Nata da Sociedade…) ou a superioridade devido à qualidade de a nata estar a flutuar, elevar em cima do leite?
De fato, esta última elação será a mais adequada no discurso que assisti, porque a pessoa estava a agradecer a presença de indivíduos, de número restrito, que se destacavam neste sistema democrático que vivemos, ao atingirem estatuto e consequentemente elevação social. Foi evidente a valorização dos determinados elementos, que por serem diferenciados na sua formação académica (não se põe a questão do mérito….) e foram enaltecidos perante os restantes constituintes da plateia, que metaforicamente, seriam o “leite”!!!!
Ora, eu considero que apesar de a família ser a unidade da sociedade que constrói o individuo, a escola é um marco importantíssimo na sua formação pessoal, social e académica. Logo o conceito de “Todos diferentes, todos iguais”, perante este discurso, para mim passou para “Todos diferente, maaaas… nem todos iguais”. Ora regressando ao politicamente correto, que seria agradecer a presença voluntária e dedicada de todos, independentemente, da sua formação académica, origem ou estatuto financeiro, contribuindo para um maior envolvimento de todos e não apenas de alguns. Ter um líder humilde que se importa com a organização (reforço interno) e valoriza o todo, e não apenas o momento, cria pontes e ligações fortes entre a comunidade. Falar dos pontos fortes de quem é desfavorecido e quer vencer; enaltecer as pessoas fantásticas que estão na estrutura organizacional (devo dizer que uma dessas pessoas escreve para este jornal, e relata a história e hábitos antigos como ninguém… Seria um ótimo palestrante ou professor ao retratar a vida antes das novas tecnologias, mas não é academicamente reconhecido! Merecia um diploma “Honoris causa”… ); reconhecer que um dos melhores ativos que tem são os alunos, que deve ter uma escuta ativa e não autoritária. Obrigar a obedecer, traz imediatismo, mas não traz consideração. Reconhecer que tem de melhorar a comunicação entre pares para chegar aos futuros líderes que são as nossas crianças e alunos.
Um ponto assente é a domínio que certos elementos da comunidade escolar têm perante os alunos, quase sempre por ameaça ou por discriminação. Assistir a uma cerimónia que se apercebe que nem todos são iguais, e que melhor será valorizar quem tem apetência para o ensino superior e que quem segue os cursos de formação pouco futuro tem no mercado de trabalho, vai de encontro ao preconizado na Lei de Bases do Sistema Educativo “uma permanente ação formativa orientada para o desenvolvimento global da personalidade, o progresso social e a democratização da sociedade.” (Decreto- Lei nº 137\2012 de 2 de Julho).
Honestamente, o sistema adequa-se a este tipo de atitude, em que excluí que não tem compadrios e desfavorece quem segue as regras. Mas porque não incluir todos no todo? Afinal a matéria é a mesma, e não haja dúvida que partilhando ideias haverá mais riqueza pessoal para todos… Vejo pessoal com categorias consideradas inferiores na administração pública com melhores competências sociais que muitos com categoria de técnico superior. Que estão bloqueados localmente por elementos ditos “superiores” por sentirem insegurança nas suas capacidades de liderança e gestão. Que em vez de terem abertura para o diálogo preferem escarnecer e descredibilizar quem sabe e quer melhorar. Para quem tem mérito e não vê reconhecimento profissional, posso assegurar que muitos são os pais, avós, tios, irmãos que agradecem a vossa dedicação e apoio. Apesar de o salário não compensar os vossos infortúnios diários, podem crer que há alguém que vos compensa com um “Obrigado” genuíno.
Tudo deve ser moderado, a “nata” pode fazer uns ótimos manjares com o “leite”, porque o que precisamos é de união e não de separação. E já agora peço perdão pela minha acidez…. Devem ser das natas!

REFLEXÕES

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Grumapa- Grupo Mangualdense de Apoio e Protecção dos Animais
Construção do canil /Gatil
Estávamos agora com 2010 à porta e já com o programa das boxes em mente. Voltávamos de novo à luta com a falta de dinheiro. Era necessário cimento, areia e gravilha. O pavimento no interior do pavilhão numa faixa de 20m de comprimento e uns cinco de largura somando a construção dos pátios exteriores absorveriam muito do material. Por outro lado o orçamento do trabalho do empreiteiro não contemplava estas obras, teria de ser pago à parte. Para além disto tínhamos de pensar nas grades para as boxes… Procurámos contactar empresas que se dedicassem à construção de canis. Obtivemos folhetos com exemplos dessas instalações. Havia muitas hipóteses – umas lindíssimas, funcionais, tipo casinhas individualizadas, com pátios e espaços amplos ….e nós, que tínhamos tanto terreno disponível não podíamos optar por esta solução! Outros exemplos que possibilitavam a sua organização no interior, também nos deixaram encantados. Contudo todas estas amostras eram caríssimas materializadas no local… Fizemos reunião de Direcção e de novo o nosso entusiamo esmoreceu…Oh! Que lindas instalações! Que belos espaços! Era isto que nós ambicionávamos! Mas … mais uma vez os nossos sonhos tinham que ser refreados, apagados da nossa imaginação…tínhamos que pegar no papel e lápis, fazermos novamente contas e tomarmos as reais dificuldades como ponto de partida…
Desistimos dessas belas imagens dos folhetos, teríamos de optar por soluções mais económicas. Iríamos procurar grades para delimitar as boxes. Fui deliberadamente à zona industrial de Coimbra contactar um armazém de estruturas metálicas, saber qualidade e preços. Perante o valor era de ignorar. Então procurei na zona industrial de Viseu – exemplares semelhantes, vários preços, um pouco mais em conta. Nova reunião de Direcção, porque as decisões tinham que ser tomadas e assumidas em comum. Aí decidimos comprar grades em bruto em aço natural (as pintadas de verde logo se tornavam bastante mais caras, assim como pela espessura do arame). A sua construção e montagem no pavilhão ficaria a cargo da Empresa ERNESTO MATIAS Lda, por um valor simbólico. Seria em princípio este o caminho a seguir. Tínhamos todavia, e mais uma vez, o problema monetário para fazer face a todos os encargos. Contámos sempre com apoio da Autarquia para fornecimento de materiais de construção. Mas para os gastos restantes teríamos de angariar fundos recorrendo às estafadas rifas, às vendas em barraquitas e alguns possíveis donativos…
Depois de termos o somatório da despesa com as boxes, tomei coragem e mais uma vez contactei a minha extraordinária Amiga, e também protectora, Dra MARIA DO CARMO ALBUQUERQUE (infelizmente já falecida), residente que foi em V. Nova de Poiares e que eu anos atrás tinha tornado sócia do Grumapa. Esta grande Amiga da nossa obra disponibilizou-se de imediato em assumir a maior parte da despesa. Assim, se hoje existem boxes no albergue a ela se devem para todo o sempre. Eu prometi-lhe que a traria cá para visitar toda a construção para a qual ela tanto contribuiu financeiramente, mas… outros valores muito, muito pequeninos se interpuseram, apagaram a oportunidade… e entretanto ela partiu!!!… Quando eu reunir toda a história do Grumapa, em livro, este virá a ser enriquecido com imagens elucidativas e documentais, desta grande obra, que afinal se foi tornando pequena se tivermos em conta os nossos sonhos, e é uma obrigação deixar para o futuro, um testemunho muito claro do poder da força anímica dum punhado de pessoas.
outubro 2019

IMAGINANDO

francisco cabral
PARTE 67
Continuação
Seguindo em frente e antes da Praia das Maçãs, cortamos à nossa esquerda, rumo às Praias Pequena e Grande. Vou destacar a Praia Grande por ser a mais frequentada. Actualmente sendo uma praia visitada por todos,  nos meus tempos de criança era uma das VIPS, só frequentada por uma elite. Graça à mudança de mentalidades, este local além de ser bastante visitado, é um dos palcos de Campeonatos Mundiais de Surf. Tem vários restaurantes ao longo da praia e uma piscina natural.
Nas noites quentes de verão é um prazer apreciar a briza do mar, caminhando ao longo da praia, ou conversando com amigos numa esplanada, tomando um bom café ou saboreando uma cerveja bem fresca.
Também e desde que o Euro abunde em nossas carteiras, podemos degustar uma boa sapateira ou lagosta. Há de tudo.
Revertendo o caminho, voltamos para a estrada que vai ligar à Praia das Maçãs. O nome dado a esta aldeia, nasceu do rio que ali vai desaguar, por em tempos passar por vários pomares de macieiras, levando no seu caudal as maçãs que caiam.
Esta freguesia muito visitada por turistas de nacionalidades diferentes, tem uma praia previligiada, embora as suas águas mesmo em pleno verão, sejam um poucos frias. Mas quem opte por uma água mais quentinha, pode usufruir das suas piscinas.
Como está bem localizada foi opção de vários comerciantes, principalmente os dedicados ao artesanato para ali se estabelecerem, assim como vários bares e restaurantes, que funcionam todos os dias do ano.
Acho uma certa graça aos estudantes, que no período de férias grandes, aproveitam o seu tempo para ganharem algum dinheiro, servindo à mesa nos diversos restaurantes. Pròpriamente não é o ordenado que usufruem, mas sim as gorjetas que ganham, principalmente com os turistas estrangeiros, a quem dão clara preferência.
Passando a Praia das Maçãs e as Azenhas do mar rumamos pelo interior até à aldeia de Janas, actualmente e ao seu redor com uma nova população já bastante considerável, que por ser um sítio muito isolado e propício ao descanso, construíu ali suas próprias residências. Note-se que a maioria desta nova população trabalha em Lisboa. A  outra parte da população, a mais antiga, dedica-se principalmente ao cultivo e vinho de Colares.
Temos em Janas uma Igreja centenária de nome São Mamede, que curiosamente não sendo quadrada como as outras, ela é circular. Segundo textos antigos, foi edificada pelos romanos em honra à Deusa Diana, a Deusa da Caça.
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Capela de São Mamede, Janas
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Interior da Capela de S. Mamede em Janas-Sintra
Como São Mamede é o protetor do gado e por tradição, os lavradores de Sintra, Mafra e  Torres Vedras, nos dias compreendidos entre 15 e 17 de Agosto levam os seus animais, dando três voltas completas à Igreja, no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio.
Nos dias quentes de verão uma grande parte da população oriunda principalmente das grandes cidades, escolhem este local para fazerem os seus piqueniques, dado ser um sítio que embora nesse período esteja quente, tem bons pinhais e bastante sombra. Para quem queira grelhados, tem um terreno específico com churrasqueiras em pedra.

AINDA ME LEMBRO!!!…

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“FAZER” A AGUARDENTE NO ALAMBIQUE
A aguardente bagaceira sempre teve um aspecto popular de rusticidade ligada ao homem do campo. As películas como os agricultores chamam, as cascas e as grainhas – que são sementes da uva – têm no seu interior óleos essenciais que dão á bagaceira sabores típicos muito apreciados. Era tão normal “ir fazer“ a aguardente no alambique de cobre como pisar as uvas e tirar o vinho do lagar. Voava a carroça de um burrito frenético transportando os sacos do cachiço que vencia diariamente a braveza do curto caminho escabroso e íngreme, e os aldeões não descorando á passagem as denegridas cruzes (alminhas) lembranças que flutuam dos mortos, descobriam-se e num gesto desajeitado rodavam nas mãos as boinas numa temência respeitosa. Era o alambique na quinta dos “Melo“. E num aroma de almas com espírito de clara realidade o dia para “fazer“ a aguardente tinha que ser previamente marcado. Feita a vindima e pisados os cachos, depois de alguns dias de fermentação é retirado o mosto (vinho) e cheios os pipos de madeira. Os restos, o cachiço ou engaço (pedúnculos e ramificações dos cachos), as peles e as grainhas ficam no lagar mais uns dias a escorrer. Os agricultores, homens tão espessos como os montes mas com a sensibilidade de um artista que dilui tudo em místicos alvores, armavam no centro do lagar o azincho e a prensa para espremer o cachiço (canganho) Retirado depois de devidamente enxuto era colocado dentro de uma dorna, coberto com folhas de videira e aterrado, assim conservado até á destilação e evitando uma invasão de mosquitos. Já no alambique é despejado nos potes de cobre aquecidos num lume forte para a mistura ferver e libertar um vapor espumoso em remoinhos, passando pelo interior de outro pote em serpentina onde circula água fria iniciando um lento processo de destilação. A primeira aguardente retirada é como água destilada (fleima) que era provada aos poucos como orvalhando lábios sequiosos, e só á medida que decorria a destilação ia saindo cada vez mais forte acompanhada na prova de um aaaahhhh!!!!... bem exclamativo pelo aquecimento fervilhante da garganta com uma eruptiva comução de gagueira e de tosse em que os olhos ficavam reféns de umas lágrimas de choro preso, voltando no final a perder o gau do seu teor alcoólico. Era natural caldear a aguardente mais forte com a mais fraca obtendo o grau certo da mistura. A aguardente sai quente e quando arrefecida é guardada em garrafões de vidro conservados bem fechados. Mas isto é uma festa que a tradição popular aproveita com alegria. No alambique assam-se as batatas com casca na fornalha, cebolas e bacalhau. Mistura-se tudo com bastante alho, regadas com o ouro líquido dos nossos olivais, o nosso luminoso azeite e como o garrafão é símbolo nacional o repasto é acompanhado com um vinho levado da adega e tirado ao espiche do tonel da colheita desse ano. Ficavam os estômagos aconchegados para a feitura da aguardente durante a noite em que um prateado luar se ouvia cair sobre as ramagens. Ensonados no silêncio de uma noite religiosa e no regresso a casa, já com o romper da aurora nas tranças do dia nas pegadas serenas da manhã ao aconchego de um qualquer sozinho lugar da minha aldeia onde as sombras do Outono são sempre eternas revestidas de uma tristeza pálida de ausências nostálgicas. São tempos de saudade, as nossas saudades de agora são as de uma risonha posteridade que não mais viveremos.

SANFONINAS

dr. jose
O cozinheiro popular
Adrega-nos encontrar, por vezes, algo que nos faz pensar. Vocábulos como «popular», «recreativo», «familiar» são tão do nosso quotidiano que, amiúde, nos passa despercebido o seu significado último.
E o que ora me fez parar foi aperceber-me de que uma publicação de 1913, cuja imagem da capa me remeteram, estava inserida numa série intitulada Biblioteca Popular Recreativa e Familiar.
Lembrei-me de imediato ter frequentado, em jovem, os bailes duma Sociedade Recreativa e de Instrução Familiar. E vi também que, em Lisboa, com data de 1836, se publicou o nº 1 (volume V) duma Bibliotheca Familiar e Recreativa.
Era a terminologia habitual, eram os paradigmas que se procuravam inculcar.
Despertou-me, pois, a atenção «O Cosinheiro Popular dos Pobres e Ricos ou o Moderno Thesouro do Cosinheiro». A Primeira Parte, a dos Pobres, contém «250 fórmulas de cosinhados simples, saudaveis e economicos», numa coordenação de D. Michaella Brites de Sá Carneiro, «chefe de cosinha portugueza na cidade do Porto». E esta é já a «terceira edição augmentada»!
Atentar-se-á, ainda, no facto de a publicação ter sido feita na Livraria Portugueza, a editora de Joaquim Maria da Costa, situada nos números 55 e 56 da Largo dos Loyos, da cidade invicta.
Há palavras que nos soam actuais e que nos perguntamos até: «Já então se pensava assim?! E como foi possível que, mais de um século passado, elas tenham entrado de novo no vocabulário corrente como se de novidade se tratasse?».
Não, não estou a referir-me à oposição pobres/ricos, que hoje se mantém e, caso dela não nos lembrássemos, lá estava a Caixa Geral de Depósitos a recordar-no-la, quando propõe uma tabela benéfica para ricos e outra, dura, para os pobres. Refiro-me aos adjectivos «simples, saudáveis, económicos», uma trilogia bem actual e bem do nosso agrado. E a um outro: «portuguesa». Quando, por todo o País, a preocupação maior, nesse âmbito da culinária, incide na vontade de manter a tradição, de mostrar o que é típico, esse adjectivo «portuguesa» vem a calhar, mesmo que os nossos cozinheiros (nessa altura, era «a chefe»!...) se afeleiem a empratar os acepipes, um naco aqui, outro acolá, bota um raminho de alecrim e outro de hortelã, à mediterrânica (tem que ser!), à… gourmet! (pois então!...).