Separar as águas…

Ana Cruz
Há que saber diferenciar entre o que são benefícios na saúde e a utilidade dos custos na saúde. Imaginar o médico (decisor) a separar os exames desejados pelo utente e os, que realmente, são necessários para a sua saúde, remete ao evento bíblico de Moisés a separar as águas com o seu cajado, dividindo o excessivo do imprescindível. Em tempos em que a tecnologia ainda estava reduzida apenas ao papel e caneta, literalmente, o punho ficaria dormente de tanto prescrever e já existia um filtro verbal conhecido como “desperdiçar o tempo e o dinheiro do Estado”. Mas será que passar uma catrefada de exames resolve ou previne a doença?
Assistir a debates acerca de economia na Saúde é demagógico. Se por um lado existe um interesse em informar o povo da necessidade de ter melhor saúde, por outro lado “esquecem-se” de informar os custos subjacentes aos cuidados de saúde. De fato, a maior parte dos profissionais de saúde desconhecem os custos dos atos que realizam, ou até das diárias hospitalares! (Quem quiser ficar esclarecido ou assutado! deve consultar a Portaria nº254\2018 de 7 de Setembro do Diário da República).
Enfim, perante este panorama é fácil de concluir que a saúde está assente em escolhas\ decisões de várias personagens. A pessoa – aquela que decide o que deseja ter para a sua saúde; médico – aquele que utiliza recursos para avaliar e diagnosticar a saúde da pessoa e os intermediários (farmacêuticos, enfermeiros, técnicos de análises, fisioterapeutas entre outros) que seguem as prescrições\ orientações médicas. Todos são responsáveis, todos deverão ser isentos e imparciais! Por exemplo se eu como pessoa desejo ter uma dieta alimentar rica em gorduras e sal, sei que provavelmente vou ser um hipertenso e ter problemas cardiovasculares. É uma decisão pessoal, mas que tem influência nos custos para a saúde, para além de ter um risco associado em chegar mais cedo ao final da vida! O médico investe em exames e terapêutica devido ao comportamento que eu tive, e será dinheiro que poderia ser investido em outra área! E tudo tem um custo (Se é injusto, é algo bem patente na convulsão social existente pelas greves…Cada um puxa a brasa á sua sardinha e não querem saber da injustiça do vizinho pois o dinheiro é um bem limitado!)
Os rastreios são uma evidência da preocupação do Estado para com determinados grupos de indivíduos, por forma a detetar precocemente a doença e reduzir a taxa de mortalidade. Os mais conhecidos são os de foro oncológico, os cancros do cólon\ intestino, mama e colo do útero já estão com uma cobertura quase total na zona Centro do País. A nível cultural e individual o cancro da mama teve um impacto enorme na consciência do sexo feminino. O conceito da imagem de mulher vem sempre associado aos seios, e perder essa caraterística física para além da não-aceitação por parte do cônjuge, pouco informado, levou a uma adesão elevada para a realização da mamografia. Apesar de ser um exame constrangedor e desconfortável, o sacrifício supera em muito o benefício de detetar atempadamente o cancro e evitar a provável remoção da mama. Já o rastreio colo do útero, tem uma adesão ainda muito aquém do requerido. A ideia de expor a intimidade que só deve ser mostrada no leito conjugal, leva a muita mulher negar e até recusar a realização da citologia cervico-vaginal. Um procedimento menos doloroso que a mamografia, apenas mais constrangedor. As mulheres são multifacetadas, e sempre observadoras quer em si próprias quer nos outros. Tudo é sujeito a ideias preconcebidas “Será que a minha é diferente? Será que vão ligar que não fiz a depilação? Será…? Será…?”. Pense na sua saúde e na sua manutenção, nem e médica\o ou a enfermeira\o vão avaliar essas ideias. E se o fizerem, evite entrar em contato com essas pessoas (pouco) profissionais, mas não evite de cuidar de si!
Já o cancro do cólon, infelizmente, é o cancro com mais mortalidade no nosso país. A realização de pesquisa de sangue oculto nas fezes (PSOF), é um exame relativamente barato comparativamente a uma colonoscopia, sendo que caso haja um resultado positivo a colonoscopia deverá sempre ser prescrita pelo médico. Devido a isso, alguns clínicos decidem logo pela colonoscopia para evitar repetição de procedimentos. Mas mais uma vez os custos são elevados, porque requer um especialista para a realização da colonoscopia, para além de análises, mas aqui é a luta entre uma gestão eficiente e o resultado esperado sem olhar aos custos.
De qualquer forma ninguém dá nada de forma abnegada, assim o Estado preocupa-se com a população selecionada a rastrear para evitar ainda mais custos em internamentos devido à doença e defender a produtividade do país prevenindo o absenteísmo laboral de cada individuo. Porque todos somos necessários para o País, independentemente dos “rótulos” que tão negligentemente utilizam, todos precisamos de manter e cuidar na nossa saúde.