AINDA ME LEMBRO!… “TU MORENA BEM A VÊS!…“

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Ainda o horizonte se cobria de alvejantes névoas madrugantes em doirados tempos matutinos , morenas já as terras cavadas espelhavam a coragem dos homens que com as camisas empapadas convulsos e inundados em suor como chuva caída em andrajo de mendigo ,regando com o suor o chão , cavavam leiras de cabo a rabo . Ainda as estrelas eram tantas no céu como poeira nas romarias e já a terra resplandecia em flor . Mangas em dobras até aos cotovelos que enchugavam um suor de grossas bátegas . Homens de coragem , como aves do céu que a gente vê sonhando , robustos , que não sabiam virar o rosto a um sol escaldante mesmo na hora em que aquecia a terra como fornalha . Cavadores duros e sombrios que só se encostavam ao cabo da enxada quando terminava a faina daquele obrigatório lavor . Braços cansados e corpo dorido . Com a pontinha da língua lambiam a branca mortalha do cigarro que paulatinamente enrolavam , absortos em pensamentos distantes : a casa , a mulher , os filhos ! … E á flor dos seus lábios esvoaçava um sorriso . Golas secas … secas como o coiro das botas ferradas que calçavam e que era preciso regá-las para amaciarem . E lá vai mais uma “ pinga” do palheto de um garrafão que rodava por todos . Soava o toque das trindades , terminara a jorna , era tempo de despegar , também um convite ao recolhimento e á oração . Haviam ganho e merecido o pão-nosso daquele dia , um magro e sofrido sustento arrancado à pobreza do solo daquelas pequenas leiras . A sua fortuna suprema era corajosamente saberem merecer a vida com uma altivez e humildade de carácter que os caracterizava e cuja plenitude culminava na sua honradez e honestidade . Eram como amálgama de componentes como o granito na sua diversificada composição de , mica , quartzo e feldspato , mas na sua homogeneidade continua sempre granito , mas que porém na pureza de cada componente , na fraga ressalta a beleza , a dureza , a nobreza . Eram usufrutários de uma pesada herança de labuta e sofrimento , herdeiros de um berço onde nasceram sem pedir e para expiar seus pecados pagos em suor lá morreram um dia sem querer , era a sua condenação de filhos das tristes ervas . Rotineiros invariáveis no tempo em que o dia era de trabalho e a noite de sono , o domingo de repouso mas o fim de semana afadigado . Apenas desejavam a tranquilidade e o descanso, bens supremos que nenhum poderoso da terra podia conceder não podendo nós tomá-los pelas nossa próprias mãos . Envelheciam tendo na memória o som de cada baque da enxada rasgando a terra e tristes e mudos ficavam meditando na morte e na voz repetida pelo seus patrões . “ Tu morena bem a vês ! … “ Viviam e morriam na dignidade da sua condição . Foram tempos aos quais já não consigo aderir `a sua realidade . Os sentidos já os relegam para a memória . Jamais os verei , mas sempre os lembrarei .