REVIVENDO

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O 25 DE MARÇO
Por férteis campos de viçosas cores terras por lágrimas beijadas ou por roxos vales de sombras e segredos todos os santos dias os pastores apascentavam os seus rebanhos naqueles dias primaveris que não são apenas dias de um estação de flores com seus encantos sua beleza e eclosão de cores mas muito mais , são o colorido das suas almas . Mas no dia 25 de Março subindo a inclinada e fragarosa encosta de Senhora do Castelo com seus rochedos mesmo á flor do rosto num sentido agradecimento de gratidão à Virgem pela abundancia de bons pastos e devotamente pedindo a protecção do gado e o farto crescimento da erva dos campos . Os dias eram já crescidos a olhos vistos e ao longe vislumbravam-se grandes distancias azuis de imensidade , nuvens e largos verdes da paisagem , turbando-lhes a visão numa luz remanescente dos seus olhos , uma imagem fabulosa que se condensava sobre os duros fraguedos comovidos . Era da tradição pastoril naquele dia subirem o monte por entre trilhos e carreiros que só eles conheciam quando o rio “ do coval “ já libertava um macio nevoeiro que com um sonho se confundia . Com os seus ornamentados rebanhos circundavam a ermida em voltas de correria onde as finas patas dos lanígeros nem trilhavam a poeira como se brando vento os levasse . Bolsa de pano ao ombro ou dependurada na pontinha do cajado com que guardavam o gado levando dentro um pecador queijo amanteigado ou seco proveniente do leite do seu gado amanhado pelas mãos calejadas de suas mães espelhos da virtude do saber . Por acompanhamento uma broa de milho saído da última fornada de pão cozido no forno comunitário . Ao lado figurando como alma de aroma num assomo de corpo de verdura , jeito agreste e doce olhar bravio fazendo já sonhar brancas tristezas que subiam das fontes que no Verão iriam secar , a botelha em barro empalhada com o precioso néctar da sua lavra um palheto que lhes dava uma nova alma lhes rejuvenescia e tonificava o espírito e apascentava seu rebanho das dores e beijando a sua alegria uma malguita com “ os pecados negros (azeitonas ) tiradas do cântaro de barro . Por esta hora já muitos rebanhos sobre as fragas esbatidos e os pastores com a manta estendida saboreiam tão inaudito repasto numa bela paisagem transcendente onde pela canícola do dia dormiam a sesta sonhando os homens e os rafeiros . A vida revela – se –lhes como um hino à alegria . Há contentamento no convívio , na paz do toque da flauta de cana , na merenda que saboreiam ouvindo ao longe os brandos murmúrios de água e de folhagem que povoavam a sua solidão no divagar por aqueles campos nos momentos em que dormiam os bosques a terra e o céu . O dia das merendas era também conhecido como “ o dia da espiga “ ou ainda “o dia da hora “ . Havia uma hora , àquele meio dia que tudo parava : as águas dos ribeiros não corriam , o leite não coalhava , o pão não levedava e as folhas cruzavam – se . Era nessa mesma hora que se colhiam as plantas para fazer o ramo da espiga . A montanha cismática de uma leal paisagem em que já era quase sensível o gemido das sombras nas arestas dos rochedos convidava-os ao regresso . Vinha com mansidão a aurora ao berço de oiro era o fim daquela tarde extensa . Descem silenciosamente cismados em fugidios pensamentos fielmente seguidos pelos seus cães guardiões incondicionais da sua segurança e do rebanho . Estava cumprida a secular tradição do inicio da época das merendas manter a tradição de uma terra onde nos seus peitos mamaram o leite que os fez irmãos das águas das pedras e do vento agreste que os havia embalado . As tradicionais feiras e festivais promotores do queijo , o tradicional queijo de ovelha bordaleira realizam-se anualmente nesta época dispersas pelas mais variadas localidades da nossa região . Mas nem sempre foi assim … e é com uma lágrima que me nasce do coração e se evapora como branco nevoeiro que são as minhas recordações .