SANFONINAS

dr. jose
A MALVA
– Temos de cortar aquela malva, não achas?
– Porquê?
– Está grande de mais, abafa a roseira pequena. E, depois, para que serve? Não nos apetece lavar ninguém com água de malvas nem para curar infecções; já não estamos em maré de atirar inimigo às malvas; não carecemos de lhes secar as folhas para chá, porque Malveira, a povoação a que deram nome, não é aqui!
– Sim. Vou apará-la, mas não a arranco. Gosto das flores dela, sabes?
Observei melhor. Quem diria? Cada uma das suas cinco pétalas, de raios violáceos, tinha na ponta uma chanfradura! À vista normal, apressada, tal seria resultado – diríamos – de roedela de bicho daninho, lagarta nociva. Não era! Requinte estético duma Natureza a surpreender-nos sem cessar!
E o gracioso recorte das folhas palmadas? Sim, lembro-me de ter aprendido em Botânica que folhas assim, em jeito de palma da mão e com cinco dedos eram palmadas e palminérveas.
Só o vírus e a quietude por ele proporcionada, a exigir agendamento de ritmo me permitiram, parar, sem pressa, na admiração de singela malva, doutra forma despercebida por completo. As flores feneceriam sem que eu nelas reparasse; as folhas – que deslumbrante desenho o das nervuras!... – acabariam por perder este verde forte, amareleceriam, tombariam murchas e finar-se-iam, incógnitas, no meio de bem desagradável lixo de jardim.
Podem estar descansadas, amigas! Aí completarão o ciclo de vida. “Resto inorgânico indiferenciado”, sim; mas, se lhes for possível ter consciência, poderão ufanar-se perante as demais:
– Sabes? Um dia, o senhor do jardim onde eu vivi, reparou em mim, achou-me bonita e até fez uma crónica a chamar a atenção para o invulgar recorte das minhas pétalas, imagina!...
Sinto-me de missão cumprida!