Mesmo com Covid 19, o Natal existe!


A época natalícia era sempre bafejada por aromas e pregões próprios que anunciam uma altura de alegria e partilha familiar. O cheiro das castanhas assadas envolvido com a fragância das folhas caducas molhados no chão fazia qualquer pessoa inspirar com os olhos fechados e suspirar com um semblante nostálgico. Era inevitável lembrar os momentos entre família de anos anteriores surgindo sempre um sorriso acompanhado de olhos brilhantes de emoção.
Para quem vivia nas cidades com origens mais rurais, o Natal era o bálsamo do alvoroço das rotinas apressadas. Para quem era poupado da ansiedade diária de viver numa cidade, nutria uma cobiça de quem vivia nas grandes cidades, mas no Natal tudo era olvidado imperando a alegria de partilhar a presença de quem não se via há tanto tempo… Tempos em que os Postais de Natal eram uma tradição e a realização do presépio era um hábito agraciado por admiração já conhecida, pela escolha do pinheiro, pela colheita do musgo, pela construção do cenário do nascimento do menino Jesus com múltiplas peças de barro tão português… e aquele momento da primeira vez que se ligam as luzes? O silêncio apenas quebrado por “Tão bonito!”
Quer seja polvo, ou galo, ou bacalhau ou perú, todos sabíamos que na consoada a mesa seria farta com iguarias que apenas a mais experienciada cozinheira da família sabia fazer… As filhós, as azevias, os sonhos, as rabanadas, eram outros dos aromas que preenchiam as nossas memórias. Em tempos que a televisão tinha 2 canais apenas, as conversas eram mais ricas que a doçaria em cima da mesa. O consumismo era definido como um luxo, mas ninguém o desejava, porque a alma estava preenchida com a família. A partilha de estar, superava em muito a necessidade de mostrar, ou exibir. Aliás, grande parte da população passou por vários sacríficos pessoais, quer seja pelo regime quer pela perda de vidas na guerra de Ultramar.
Hoje o Natal é atulhado de anúncios para consumir coisas que geram pouca alegria, e desviam do verdadeiro valor de partilhar… Lembro-me de uma avó dedicada para ver os netos, que decidiu adoçar a gula das crianças fazendo uns sonhos e umas filhós, com a fadiga entornou óleo em suas mãos e fez queimaduras bastantes feias no braço. Enquanto tratava da sua ferida corriam lágrimas pelas suas faces sulcadas pelos anos, e pensando tratar-se de dor, desculpei-me pelo incontornável sofrimento. “Não Srª Enfermeira, choro porque tive tanto trabalho e eles decidiram ir para o Algarve passar o Natal com os amigos”. A presença nem sempre tem de ser física, mas pode ser dedicada e valorizada com muito amor! Bom Natal e estimem quem mais vos ama!