SANFONINAS

Agrada-me a sua resistência…
Não é porque dietistas proclamem os seus elevados benefícios para a regulação intestinal, prevenção de ataques cardíacos e diminuição da vontade de comer. É porque também me agrada a luta que tenho de travar para a partir. Precisa-se de escolher bem o jeito, aperta agora, tenta outra posição… E vem depois aquele estalar dolente, rachado, como num estertor raivoso: «Eu não queria que me abrisses!»…
Habituei-me a comer duas ou três nozes enquanto a gente se arruma à mesa. E, para além dessa resistência que me agrada, confesso que não resisto a admirar a forma inteligente como o fruto por completo se torceu para aproveitar todos os recantos disponíveis. Inconcebível engenharia divina!


Outro dia, escrevia-me Júlia Nery: «Estou a ler os textos, saboreando conteúdo e escrita, “como quem trinca  bagos de romã sumarenta”». Também a romã me encanta. Aliás, sempre encantou o Homem, os Romanos quase lhe prestavam culto como manjar dos deuses… Encanta-me o trincar, mas encanta-me sobretudo ver como a Ana precisa de ter um cuidado enorme, ao descascá-la, para que nenhum bago se esmague, tão imbricados eles estão, tão bem aconchegadinhos!…
Tive a dita de ler em moço o livro «Belezas Ignoradas», do Dr. Thiámer Topth, professor da Universidade de Budapeste. Comprei a 2ª edição (Coimbra Editora, 1958), que ainda conservo, qual relíquia, a precisar de encadernação cuidada. Foi com ele que aprendi a adestrar o meu espírito de observação e a admirar tantas belezas que me passavam despercebidas. Comecei, inclusive, um dossiê de folhas soltas sobre animais, em que fui escrevendo tudo o que de curioso ia lendo. Sobre a aranha, por exemplo, um bicho que sempre me cativou, tenho manuscritas nove páginas!
Copiei do livro «Our animal neighbours», de Alan Devoe (McGraw-Hill, Nova Iorque, 1953, p. 228) a resposta a esta pergunta: como se explica que a aranha não fique pegada à teia como os insectos que ela quer apanhar? É que deixa sempre uma «zona livre», um terreno seguro onde ela se pode emboscar, sem qualquer risco de ficar agarrada! E eu ficara a saber, na página anterior, que a aranha fabrica um fio muito fino de que se serve para tecer os sacos onde guarda os ovos; outro, mais espesso, para apanhar as presas e, à medida que vai e vem na teia, continuamente produz um fio, que é o seu fio condutor! Pensava Ariadne que descobrira uma novidade quando dera ao seu apaixonado Teseu um fio para, desenrolando-o, ele se orientar na saída do labirinto de Creta!…