“Mangualde – Patrimónios Municipais” foi apresentado publicamente este mês de Julho

Apresentação esteve a cargo de Jorge Sobrado,
que partilha a sua leitura nas páginas do Renascimento

Uma publicação é, muitas vezes, uma luta contra o esquecimento, contra os efeitos da erosão do tempo. Outras vezes um ato de amor. No caso de “Mangualde – Patrimónios Municipais”, da autoria de António Fortes, e Edição do “Renascimento”, ela é as duas coisas, na mesma medida. “Foi a pensar na beleza das pedras que brotou este livro”, diz a certa altura o autor.
Tive o gosto de apresentar publicamente esta nova obra, no passado dia 2 de julho, na Biblioteca Municipal de Mangualde. Nessa ocasião, tive a oportunidade de destacar que esta publicação – pequena em tamanho, mas expressiva em significado – constitui um “inventário amoroso” dos patrimónios mangualdenses, materiais e imateriais. Se o indelével José Mattoso confessava que “a minha visão da história humana é contemplativa”, não deve ser diminuído o valor de obras afetivas como esta – uma espécie de “viagem na minha terra” de António Fortes. Ela atravessa lugares de história e de memória, achados arqueológicos, tradições e estórias.
Se a cultura é de todas as inutilidades a mais útil, este inventário configura uma espécie de guia de viagem, um “livro de registo” útil, quer a um visitante motivado na redescoberta de Mangualde, quer a quem abrace a necessária tarefa da valorização cultural e turística do concelho. Que outro melhor recurso tem, por exemplo, o turismo de que uma boa história (desde que singular e bem contada)? Como construir identidade e atratividade locais sem raízes, sem tradições e memórias próprias?
A leitura desta obra surpreendeu-me e agarrou-me, precisamente, pelo poder das histórias aí contadas, quais revelações, ainda que de forma abreviada. São os casos da incrível “novela” cinematográfica desse Al Capone da Beira que foi João Brandão, do encantamento cénico da silenciosa mas colorida romaria de Santo António de Cabaços, da imponência do Real Mosteiro de Maceira Dão (ao abandono e em ruína acelerada, como faz notar António Fortes), do perfume eloquente do Palácio dos Condes de Anadia ou do magnetismo de figuras como Maximiano de Aragão.
Enquanto obra relativa a um “legado”, este livro de António Fortes suscita essa pergunta: o que fazer com estes patrimónios? Como travar o esquecimento e o despovoamento?
Deve perdoar-se ao autor, por tudo isto, as pequenas gralhas de edição, circunstância motivada pela pressa da partilha. Adiar e procrastinar são atos de desamor e, sabemo-lo por experiência própria, venenos conhecidos contra o património. Pode bem o leitor dedicar-se às justas correções.
Obras oportunas como “Mangualde – Patrimónios Municipais” são sempre um repto para alguma coisa mais, no futuro. Este trabalho, para ser levado a sério, deve dar origem a muitos outros trabalhos.