Dilemas éticos: informar sem assustar


Ainda me lembro de um “iluminado”, questionar o consentimento informado, formulário que se disponibiliza aos utentes perante qualquer técnica mais invasiva: “Vejam, lá agora, que para operar temos que ter autorização deles. Deviam era de agradecer de os operar, isso sim!” - acompanhado com ar ultrajado e agastado, por colocar em primeira instância, a liberdade de escolha e decisão da pessoa que iria ter o “privilégio” de ser operada por sua “Senhoria”, ilustre na arte do bisturi e do retalho. De fato, este “santo” seguia a filosofia académica estabelecida por quem exercia medicina alguns anos atrás: “Deus no Céu, médico na Terra!”
Isto é bem visível nas consultas, cujo diálogo entre médico-utente, termina sempre pela “sábia” afirmação: “Eu é que sei!” – perante questões sobre medidas alternativas ou esclarecimento de diagnóstico. Felizmente, a escolaridade evoluiu, ao ponto de quem está a necessitar de consulta, também é “Doutor”, disfrutando de uma altivez esclarecida dos seus direitos. Infelizmente, para os “ilustres” e “generosos” mestres da arte do tratar, passaram a ser sujeitos a iniciar uma relação terapêutica e moderar um pouco a arrogância e o desdém. Apesar do poder do conhecimento ser especifico na sua área, a partilha de informar para equilibrar o processo de tratamento\ cura, é fundamental para um provável sucesso do caso clínico.
É de louvar, quem quer ser participativo no seu processo de saúde\ doença, por ser o caminho certo para chegar à cura ou diminuição de sofrimento e angústia, para além de evitar conflitos internos e externos à pessoa. O tempo é um elemento limitativo no ato de informar, devido à burocracia ainda inerente à promoção da saúde, no entanto ocultar informação traz sempre atribulações, muitas vezes fatais ao principal interessado. Não tem de ser sempre o médico, a fornecer informações válidas acerca da saúde\ doença do individuo, de fato os enfermeiros são figuras sempre presentes e bastante capacitados para esclarecer, assim como os farmacêuticos, entre outros. A legislação portuguesa confere ao médico, a quase total responsabilidade de informar acerca do diagnóstico\ prognóstico, mas eticamente todos os elementos da equipa de saúde devem participar no processo de capacitação do utente. Todos somos pessoas, todos temos a possibilidade de estarmos debilitados física ou mentalmente, mas isso não dá o direito de perdemos a dignidade de decidir no pouco que temos e controlamos: ser consciente da nossa existência e da importância da mesma.