Velhos são os trapos, ou serão as ideias?


Numa sociedade cada vez mais púdica no palavreado, caracterizar uma pessoa como velha torna-se ofensivo, com argumentação ética e moral para definir, que essa mesma pessoa, é idosa! A delicadeza de ocultar que os idosos deste país, especialmente os que vivem no meio interior, têm limitações na sua autonomia física e mental, retratam a situação que passo a descrever: Um casal de idosos, sem filhos, com pouca proximidade com a família, vê-se obrigado a recorrer várias vezes aos serviços de saúde, devido a acidentes domésticos. Ela, com dificuldades na mobilidade, usa sempre uma muleta ou andarilho, ele, por sua vez, está constantemente a embater nas escadas ou a cair nos terrenos que lhe dão algum sustento alimentar. Ela, dona de casa, cuidadora dos dois, sofre várias quedas, uma até envolveu uma queimadura de 2ª grau na coxa, que limita, ainda mais, a sua autonomia…
A questão que levanto é esta: Que levantamento tem sido realizado, para identificar esta comunidade? Não surgem sorrindo nos cartazes publicitários, alusivos a turismo sénior, mas investiram muito da sua vida na aldeia, concelho, mantendo o parco comércio tradicional… tradicional, é serem olhados como pessoas rijas, que ao pedirem auxílio é revelar fraqueza perante os demais. Receosos de serem despojados das suas casas, ambiente conhecido durante décadas, e lançados para “hotéis” de permanência ambígua, partilhados com pessoas desconhecidas. Aliás, até o fato de terem uma pessoa a cuidar dos seus pertences, coloca muitas preocupações…O que antes era espontâneo, sendo um ritual familiar, estabelecendo uma convivência e encontros que favoreciam a partilha de afetos e valores, hoje em dia, os resultados são o isolamento e a insegurança!
Lembro-me, incrédula, de um idoso acamado, ficar horas infinitas a olhar para a parede do seu sombrio quarto, porque a filha – já reformada…- não queria ter de adaptar a sua própria casa. “Sabe, Srª Enfª, tenho lá o meu neto todos os dias, e era muito chato ter o meu pai lá, em minha casa! Para além da falta de tempo, tenho muitos tapetes e móveis. Acho que o lar é a melhor escolha!” Mais tarde foi para a antecâmara do lar, também conhecida por Unidade de Cuidados Continuados, onde recuperou peso, e melhorou visivelmente… Já a filha, “solidariamente”, ia visitar o pai todos os dias, permanecendo 3 horas ao seu lado a ver a televisão de programação de plástico, enquanto outros cuidavam do seu pai ao mesmo tempo.
Em Portugal, valoriza-se a criatividade burocrática para chegar à simplicidade que é: ser solidário, respeitar e responsabilizar-se com as pessoas mais vulneráveis.