DIA MUNICIPAL PARA A IGUALDADE DE GÉNERO


O Município de Mangualde, realizou no passado dia 24 de outubro, várias ações que pretenderam assinalar o Dia Municipal da Igualdade.
Assim, o dia começou com o atelier “Crescer Igual” na Obra Social Beatriz Pais Raul Saraiva e teve depois continuidade com a peça “Os brincos à Ronaldo e outras histórias”, que serviu para desconstruir estereótipos, “A igualdade é justiça, é inclusão, é solidariedade, é paridade e é essencialmente humanismo. Todos devemos ajudar a combater as desigualdades sociais para uma sociedade muito mais justa e equitativa”, sublinhou Maria José Coelho, vereadora da Ação Social.
Para encerrar este dia, teve lugar no auditório da Câmara Municipal de Mangualde, a sessão “Empreendedorismo no Setor Primário e Igualdade de Género”, promovida pelo Gabinete de Apoio ao Agricultor e que contou com a presença dos vereadores Rui Costa e Maria José Coelho, a Sub Diretora Regional da Agricultura Vanda Batista e Carla Moreira da Associação de Desenvolvimento do Dão.
A sessão permitiu que o município lançasse o desafio para aquilo que podem ser atividades complementares, atividades estas, nas quais Mangualde tem experiência e casos de muito sucesso, ou seja, casos onde complementarmente à atividade profissional de cada um é possível vingar na agricultura, através de pequenos investimentos no setor primário, ali expressos no testemunho de três empresárias nas áreas da apicultura, da vinha e dos frutos vermelhos. Saliente-se ainda, o caso de Isménia Albuquerque, de 74 anos, que para não ficar dependente de terceiros, tirou a licença de condução de trator para poder tratar das vinhas.
“As pessoas sentem-se bem, no final conseguem auferir mais rendimento e tem sido motivador, daí convidarmos algumas pessoas para dar o seu testemunho”, frisou Rui Costa.
A atividade agrícola, como atividade complementar, é possível na nossa região, uma vez que Mangualde se situa num território que está organizado por minifúndios, não havendo áreas significativas para que as pessoas apostem a tempo inteiro no setor.
“Estamos empenhados em criar todas as condições para que o número de explorações cresça e que cada vez mais mulheres possam olhar para o mundo rural como uma grande oportunidade e como complemento à sua atividade principal”, frisou Rui Costa.
Por sua vez, Maria José Coelho, do pelouro da Ação Social, destacou a importância de se assinalar este dia, neste caso, com esta temática tão importante, o setor primário e a sua rentabilidade para as famílias, particularmente por ser a primeira vez que o município trabalha nas questões da igualdade a agricultura.
“A agricultura, o setor primário também está imbuído de tanta igualdade. Hoje temos mulheres no setor primário a ser empreendedoras”, destacou Maria José Coelho.
Na sessão, e com dados do INE (2019) foi possível concluir que as 38% das explorações agrícolas de Mangualde, estão sob o domínio das mulheres, ou seja, das 1329 explorações, (total de 1562 hectares), 500 estão nas mãos de mulheres (37,6%) e 829 (62,37%) são lideradas por homens. Ainda de acordo com a mesma fonte, em 2009 no concelho de Mangualde, haviam 488 mulheres e 855 homens empreendedores no setor primário. Uma década depois, em 2019 as mulheres dedicadas ao setor subiram para 500 e o número de homens desceu para 829.

A propósito deste tema e por forma a obtermos uma melhor imagem de como se carateriza atualmente a questão da Igualdade de Género no concelho de Mangualde, falamos com Maria José Coelho, Vereadora na Câmara Municipal de Mangualde.

Como carateriza atualmente a questão da Igualdade de Género no concelho de Mangualde?
Quase a comemorarmos os 50 anos após o 25 de Abril de 1974 e o processo revolucionário que lhe esteve associado não posso deixar de destacar os gigantescos avanços no processo emancipador das mulheres portuguesas que a revolução de Abril instituiu nas liberdades democráticas para poderem assumir plenamente os seus direitos.
Tais mudanças apenas foram possíveis graças aos esforços de várias mulheres que, mostrando o seu desagrado por o que era o suposto lugar da mulher na sociedade, lutaram para que o seu papel tivesse mais impacto na sociedade e para obterem os direitos que lhes eram merecidos.
Desde o direito ao voto, ao acesso à saúde, à educação, à liberdade individual, ao emprego, à política, elas foram mulheres inspiradoras e lutadoras para que hoje tivéssemos os mesmos direitos e as mesmas oportunidades que os homens.
No concelho de Mangualde e segundo dados dos Censos, em 2021, a população residente é na sua maioria pertencente ao sexo feminino, o que não se traduz na população com atividade económica em que prevalece o sexo masculino (53.4%) sobre o sexo feminino (46.6%).
Ao nível da população com atividade económica, o sexo feminino encontra-se em desvantagem no conjunto da população empregada, e em maior número na população desempregada, o que é revelador da existência ainda, de uma desigualdade no acesso ao mercado de trabalho pelas mulheres.
O trabalho está a ser feito, mas esta “questão” da igualdade de género tem que começar dentro da casa de cada família e, depois ela é transversal a todas as esferas da sociedade. Ou seja, cabe a cada um/uma avaliar se estão a exercer os “papeis” corretos, nomeadamente a divisão de tarefas, para que ambos os conjugues tenham, por exemplo, as mesmas oportunidades de terem uma carreira profissional e a poderem desenvolver com tranquilidade. Na comunidade, o município tem tido a função de alertar e sensibilizar para esta questão, tentar mudar mentalidades enraizadas dum patriarcado ainda resistente com ações de formação e sensibilização para todas as faixas etárias, para as questões da igualdade de género.

Quais os setores onde a diferença Homem/Mulher é ainda acentuada?
Temos consciência que a mulher casa mais tarde, tem menos filhos, trabalha a tempo inteiro, está em maioria nas faculdades, mas ainda ganha menos do que os homens nos quadros superiores e quando o desemprego bate à porta é a mais afetada.
A taxa de atividade feminina encontra-se estreitamente ligada a fenómenos sociais como a progressiva escolarização da mulher e com a sua entrada no mercado de trabalho e com a obtenção de um novo estatuto social, a obriga a conciliar a vida familiar com a profissional e acarreta maiores desafios para a conciliação dos multi-papéis que a mulher desempenha na sociedade.
Deixo uma referência do que li há dias e que considero reveladora para a questão que é colocada: “Nos dias de hoje a mulher ainda luta pela conciliação do trabalho com a vida familiar, sendo que 909 mil mulheres trabalham ao sábado em Portugal, o que equivale a 39% das mulheres empregadas no país. 524 mil mulheres trabalham ao domingo e 379 mil trabalham por turnos. Dos pedidos de mulheres ao CITE para trabalharem em horário flexível para atendimento à família, 84,5% foram recusados pela entidade patronal.”

A mentalidade já começa a mudar ou existe ainda uma diferença muito grande entre a mentalidade dos jovens e a dos mais velhos, no que toca ao lugar da mulher na sociedade?
Volto a falar do 25 de Abril, porque é importante perceber as mudanças que contribuíram para o papel da mulher na sociedade.
Em 25 de Abril de 1976, entrou finalmente em vigor a nova Constituição que estabeleceu a igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios e, em 1978, desapareceu, no Código Civil revisto, a figura de «chefe de família».
No direito de família, mulheres e homens passaram a ter um estatuto pleno de igualdade.
Em 1979, a lei declarou a igualdade em oportunidades e tratamento no trabalho a homens e mulheres.
Em 1983, entrou, por seu turno, em vigor o novo Código Penal, que introduziu inovações no que dizia respeito aos maus-tratos entre cônjuges e à falta de assistência à família.
Em 1997, na 4.ª revisão constitucional, a Lei considerou tarefa fundamental do Estado a promoção da igualdade entre homens e mulheres e o princípio de não discriminação em função do sexo no acesso aos cargos políticos.
Como se vê houve muita alteração legislativa e continua a haver até aos dias de hoje, bem como muitos organismos públicos que têm tido um papel importantíssimo na promoção e disseminação da igualdade, como a CIG – Comissão para a Igualdade de Género, a CITE, os movimentos feministas como a UMAR, várias associações, a exemplo a ACCIG, e os próprios governos com a criação de Secretaria de Estado para a Igualdade. Mais, para quem está atento as candidaturas ao PRR ou ao PT 2030 exigem requisitos de igualdade de género. São meros exemplos que fazem toda a diferença, mas que projetam um caminho que se vai fazendo ao longo dos tempos.
Quanto à questão colocada quero acreditar que a mentalidade está a mudar, mas esta mudança está em nós. Já vi idosos/as com mentalidade de jovens e também, já vi o contrário. As relações de poder na intimidade entre casais, por vezes provocam situações confrangedoras sobretudo para as mulheres. Daí o trabalho que se tem feito com ações sobre a violência doméstica, sobre a violência de género, o trabalho nas escolas sobre o bullying e a violência de género, o assédio moral nas empresas.
É preciso fazer acreditar que a mulher tem um importante papel na sociedade em todas as esferas, desde o seio familiar ao profissional. Daí a importância da conciliação da vida familiar, pessoal e profissional.

Drª Maria José, o que tem sido feito por parte do município para que as diferenças de género sejam cada vez mais atenuadas?
A autarquia tem vindo a desenvolver esforços no sentido de promover ações que lancem e legitimem a temática da igualdade de mulheres e homens nas instituições e comunidade em geral. Disso é exemplo, a assinatura do Protocolo para a Cidadania e Igualdade de Género, com a CIG – Comissão para a Cidadania Igualdade de Género, sendo assim, uma das Autarquias do País que integram uma Rede Europeia para a Promoção da Igualdade de Género e Não Discriminação, promovendo assim mais justiça social, mais oportunidades e mais desenvolvimento.
A Constituição da Equipa para a Igualdade, na sequência da Assinatura do Protocolo de Cooperação com a CIG, veio também dar um incentivo à participação e à discussão das questões ligadas à igualdade de género e de oportunidades.
As ações desenvolvidas visam para além do conhecimento da realidade social ao nível da Igualdade de Oportunidades e de Género, lançar esta temática para a reflexão, visando a sensibilização da comunidade para a sua importância.
O Público-Alvo destas ações tem sido na sua esmagadora maioria a Comunidade, os Colaboradores/as da Autarquia, as Mulheres Desempregadas inscritas no Gabinete de Inserção Profissional, a Comunidade Escolar, nomeadamente jovens alunos do 1º ano até ao 12º ano de escolaridade e os Técnicos do Terceiro Setor, no sentido de promover a mudança de mentalidades e a adoção de novas metodologias de trabalho que incluam a Igualdade de Oportunidades e de Género.
Foi também com este objetivo que, o Município integrou o Projeto Internacional “Local Gender Equality”, no sentido de combater as desigualdades entre homens e mulheres e de promover a conciliação, na sua área de atuação e nos diversos domínios, nomeadamente Urbanismo, Habitação e Ambiente; Educação, Saúde, e Ação Social; Cultura, Desporto, Juventude e Lazer; Gestão de Pessoas, Formação e Emprego; Comunicação e Cidadania Participativa; Mobilidade e Segurança.
No presente momento integra o Projeto “+ Igual Viseu Dão Lafões– Plano Municipal para a Igualdade”, através da implementação de um plano de capacitação para a igualdade que se traduza num envolvimento concertado das estruturas internas do município e outros stakholders da comunidade, visando uma sociedade mais justa e igualitária.
O Município de Mangualde integra ainda, como membro fundador, a Rede de Autarquias para a Igualdade que tem como objetivo geral, promover o trabalho em rede, estimulando o diálogo acerca da igualdade entre mulheres e homens e da conciliação, assente na criação de uma Rede de Autarquias, com abrangência nacional e trabalho reconhecido nesta área, que em conjunto se propõem a testar instrumentos e metodologias já validados, com vista à criação de medidas de ação positiva inovadoras e passiveis de serem incorporadas por outras autarquias no País.

Srª Vereadora, o que acha, algum dia a mulher conseguirá um lugar igual ao do homem ou a diferença estará sempre presente?
Costumo dizer que o caminho faz-se caminhando e a diferença existirá ou não se cada uma de nós contribuir para que isso aconteça. O “mundo da igualdade” não é perfeito, é uma utopia, continua a haver muitas desigualdades. No entanto, cabe a cada um/a de nós fazer essa diferença e continuar a trabalhar para minimizar as desigualdades. O objetivo é termos uma sociedade mais equilibrada, mais justa, mais equitativa a todos os níveis de intervenção.

Algo mais que queira deixar e julgue importante transmitir
A questão de igualdade de género e consequentemente a questão de acesso igualitário a oportunidades, é algo que deve ser transversal e preocupação de homens e mulheres, pois é acima de tudo uma questão de direitos humanos. Assim e para além de ser um direito humano básico, urge que, a igualdade entre homens seja uma realidade não só no presente, mas também como para o futuro das novas gerações. Só deste modo poderemos alcançar um desenvolvimento sustentável da sociedade, que se pretende cada vez mais justa e respeitadora das diferenças.