Arquivo diário: 2 de Abril de 2019

EDITORIAL Nº 751 – 1/4/2019

patrao
Caro leitor,

No seguimento do editorial da quinzena passada, gostaria de me alongar, novamente, sobre o difícil tema da morte.
Dizia eu, na última edição, que é bom viver com as boas memórias de amigos, que infelizmente morreram mas com a dignidade de quem viveu uma vida boa e contribuiu para a vida de terceiros. Assim serão lembrados.
Um dia, estava eu com um grande Homem e Amigo, a falarmos um pouco de tudo aquilo que nos vinha ao pensamento, quando, sem rodeios, e às páginas tantas, eu senti a necessidade de lhe dizer que tinha sido um grande Senhor, um Homem, por tudo aquilo que tinha feito e construído na vida. A resposta dele foi: “Ó Serafim…olha para ali”. Do lado esquerdo, o cemitério fazia parte da paisagem. Disse ele: “Ali estão todos os grandes Homens”. Fiquei um pouco calado. Já lá vão uns valentes anos, mas aquelas palavras marcaram-me e ficaram na minha vida.
Reconfortei-me com um ensinamento da minha Mãe, que Deus tem. Um dia disse-me que se soubesse o dia da morte, plantava uma árvore no dia anterior. Queria ela dizer que continuaria sempre a trabalhar como se nunca morresse. Assim também eu faço, tento todos os dias plantar árvores.
Dizia o meu amigo que o Cemitério está cheio de Heróis, ou seja, o Ser Humano não tem importância alguma, só tem a que realmente lhe dão ou sente que tem. És importante para ti porque é a ti que te sentes. És tudo para ti, porque pensas que o Mundo gira à tua volta. És importante para ti, porque só tu és importante para ti. Se és assim, não serão os outros assim? Coloca-te ao lado dos fortes e verás o quão pequeno és…
A Maria, o Zé, o Alberto e o Matias e todos os nossos outros mortos que como nós todos eram importantes para si e para si apenas, enquanto eram vivos. Contudo, hoje, sei por certo, Maria, Zé, Alberto e Matias, que apesar da vaidade humana, há gente viva que tem a alma a chorar-vos, a lembrar-vos, a contar feitos da vossa vida, como se estivessem ainda vivos.
Eu, que sou importante para mim, centro do meu próprio universo, penso em vocês que já partiram e lembro-me sempre das nossas memórias.
Dedico estas palavras com carinho ao meu amigo que morreu com a dignidade com que viveu. A morte não é o nosso fim.

Um abraço amigo,

REFLEXÕES

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GRUMAPA - grupo mangualdense de apoio e protecção dos animais
O (primeiro)TERRENO
Qualquer pessoa ou grupo que anseie desenvolver um projecto seja privado ou colectivo deve-se mentalizar de que irá gastar muitas energias mentais e físicas, vai ter muitos momentos de desânimo, muitas vitórias e muito provavelmente também fracassos. Se é um grupo terá de haver muita coesão e conjugação de esforços entre os elementos. Com coragem, persistência e objectividade com certeza muitos obstáculos serão ultrapassados. O historial desta associação é longo e difícil. Conhecê-lo, talvez ajude outros a perceber que nada se consegue sem grande empenhamento, lucidez, honestidade e sacrifícios e possa contribuir para que se venha a fazer uma avaliação justa de todo o processo até aos dias de hoje…
O anseio que nos movia neste início era encontrar um espaço adequado à construção de instalações para albergar animais abandonados e em sofrimento. Era uma urgência e a cada um dos elementos da direcção cabia fazer as suas pesquisas. O terreno teria de se localizar relativamente próximo da rede eléctrica e possuir água. De repente surgiu uma informação. Alguém estava a vender uma parcela com cerca de 10.000m2 localizada entre a povoação da Mesquitela e Mourilhe. Depois dos contactos fomos fazer uma avaliação – era muito interessante, plano, com arbustos e algumas árvores, bem localizado, observando-se dali todo o monte da Senhora do Castelo. Muito bem …
O preço – 600 contos, ao tempo, mas por especial simpatia do vendedor pagaríamos só…500! Um começo assim … e sem fundos!
Reunimos para meditar… Era óptimo, mas…! De qualquer modo não queríamos perder esta
oportunidade. Tinha de se tomar uma atitude arrojada – angariar fundos procurando motivar os cidadãos com mais capacidade financeira para darem a sua colaboração, a par, desenvolveríamos actividades que nos rendessem mais algum dinheiro. Recordo-me de, logo nos primeiros contactos, termos sido recebidos com muita compreensão e carinho. Cabe-me aqui nomear os primeiros apoiantes, numa justa homenagem e em agradecimento – Dr. Sérgio (Farmácia Feliz), Dr Lúcio (Farmácia Albuquerque), Eng. Tavares, D. Lúcia (do talho), fabrica Ernesto Matias, Sr. Morais (drogaria), Sr. Valeriano Couto e ainda contribuições mais pequenas mas muito importantes, tendo-se conseguido em poucas semanas a soma de 400 contos, faltavam 100 que foram assumidos pela presidência, ao tempo. Espero que não tenha cometido nenhuma falha nas nomeações…
Foi, pois, com muita alegria que fizemos a escritura deste simpático espaço e cuja legalização nas Finanças levou mais 40 contos disponibilizados pela presidente. Mas o belo sonho começava a materializar-se … o mau viria a seguir.
Passadas algumas semanas, quando já pensávamos num projecto que fosse pouco dispendioso e exequível fui contactada pelo Presidente da Junta de Freguesia, Sr. César, com uma notícia demolidora… “Os senhores não podem construir um canil daquele lugar” !! Porquê ?!! “As veias da água que abastecem os fontenários da aldeia passam por lá no sub – solo, se surgisse qualquer contaminação teriam de abandonar tudo.” Fiquei muda! Isto não podia estar a acontecer !! A Direcção reuniu de emergência para avaliarmos o impacto. Para já era preciso a confirmação pelos técnicos especializados. Foi o trabalho que se seguiu.
Março 2019

Separar as águas…

Ana Cruz
Há que saber diferenciar entre o que são benefícios na saúde e a utilidade dos custos na saúde. Imaginar o médico (decisor) a separar os exames desejados pelo utente e os, que realmente, são necessários para a sua saúde, remete ao evento bíblico de Moisés a separar as águas com o seu cajado, dividindo o excessivo do imprescindível. Em tempos em que a tecnologia ainda estava reduzida apenas ao papel e caneta, literalmente, o punho ficaria dormente de tanto prescrever e já existia um filtro verbal conhecido como “desperdiçar o tempo e o dinheiro do Estado”. Mas será que passar uma catrefada de exames resolve ou previne a doença?
Assistir a debates acerca de economia na Saúde é demagógico. Se por um lado existe um interesse em informar o povo da necessidade de ter melhor saúde, por outro lado “esquecem-se” de informar os custos subjacentes aos cuidados de saúde. De fato, a maior parte dos profissionais de saúde desconhecem os custos dos atos que realizam, ou até das diárias hospitalares! (Quem quiser ficar esclarecido ou assutado! deve consultar a Portaria nº254\2018 de 7 de Setembro do Diário da República).
Enfim, perante este panorama é fácil de concluir que a saúde está assente em escolhas\ decisões de várias personagens. A pessoa – aquela que decide o que deseja ter para a sua saúde; médico – aquele que utiliza recursos para avaliar e diagnosticar a saúde da pessoa e os intermediários (farmacêuticos, enfermeiros, técnicos de análises, fisioterapeutas entre outros) que seguem as prescrições\ orientações médicas. Todos são responsáveis, todos deverão ser isentos e imparciais! Por exemplo se eu como pessoa desejo ter uma dieta alimentar rica em gorduras e sal, sei que provavelmente vou ser um hipertenso e ter problemas cardiovasculares. É uma decisão pessoal, mas que tem influência nos custos para a saúde, para além de ter um risco associado em chegar mais cedo ao final da vida! O médico investe em exames e terapêutica devido ao comportamento que eu tive, e será dinheiro que poderia ser investido em outra área! E tudo tem um custo (Se é injusto, é algo bem patente na convulsão social existente pelas greves…Cada um puxa a brasa á sua sardinha e não querem saber da injustiça do vizinho pois o dinheiro é um bem limitado!)
Os rastreios são uma evidência da preocupação do Estado para com determinados grupos de indivíduos, por forma a detetar precocemente a doença e reduzir a taxa de mortalidade. Os mais conhecidos são os de foro oncológico, os cancros do cólon\ intestino, mama e colo do útero já estão com uma cobertura quase total na zona Centro do País. A nível cultural e individual o cancro da mama teve um impacto enorme na consciência do sexo feminino. O conceito da imagem de mulher vem sempre associado aos seios, e perder essa caraterística física para além da não-aceitação por parte do cônjuge, pouco informado, levou a uma adesão elevada para a realização da mamografia. Apesar de ser um exame constrangedor e desconfortável, o sacrifício supera em muito o benefício de detetar atempadamente o cancro e evitar a provável remoção da mama. Já o rastreio colo do útero, tem uma adesão ainda muito aquém do requerido. A ideia de expor a intimidade que só deve ser mostrada no leito conjugal, leva a muita mulher negar e até recusar a realização da citologia cervico-vaginal. Um procedimento menos doloroso que a mamografia, apenas mais constrangedor. As mulheres são multifacetadas, e sempre observadoras quer em si próprias quer nos outros. Tudo é sujeito a ideias preconcebidas “Será que a minha é diferente? Será que vão ligar que não fiz a depilação? Será…? Será…?”. Pense na sua saúde e na sua manutenção, nem e médica\o ou a enfermeira\o vão avaliar essas ideias. E se o fizerem, evite entrar em contato com essas pessoas (pouco) profissionais, mas não evite de cuidar de si!
Já o cancro do cólon, infelizmente, é o cancro com mais mortalidade no nosso país. A realização de pesquisa de sangue oculto nas fezes (PSOF), é um exame relativamente barato comparativamente a uma colonoscopia, sendo que caso haja um resultado positivo a colonoscopia deverá sempre ser prescrita pelo médico. Devido a isso, alguns clínicos decidem logo pela colonoscopia para evitar repetição de procedimentos. Mas mais uma vez os custos são elevados, porque requer um especialista para a realização da colonoscopia, para além de análises, mas aqui é a luta entre uma gestão eficiente e o resultado esperado sem olhar aos custos.
De qualquer forma ninguém dá nada de forma abnegada, assim o Estado preocupa-se com a população selecionada a rastrear para evitar ainda mais custos em internamentos devido à doença e defender a produtividade do país prevenindo o absenteísmo laboral de cada individuo. Porque todos somos necessários para o País, independentemente dos “rótulos” que tão negligentemente utilizam, todos precisamos de manter e cuidar na nossa saúde.

IMAGINANDO

francisco cabral
PARTE 55
Lei da Atração-Continuação
A Lei da atração também abraça a Lei da Causa e Efeito.
Talvez o Leitor queira uma resposta a esta pergunta: Porque razão existem doenças?
Posso dá-la sob minha perspetiva: Tudo o que é mental se reflete no físico, ou seja tudo o que envia para o Universo regressa ao físico na mesma proporção. Quando estamos projetando (pensando) medo, ciúme, raiva ou inveja, estes miasmas, a antimatéria prejudicando terceiros ou nós próprios pela depravação ou vício, estamos resistindo aos desígnios da Alma. Os eletrons nas suas órbitas atómicas, provocam uma desarmonia energética na estrutura de nossas células, pelo Corpo de Emoções ou Astral e vai impregnar essas baixas vibrações no  Corpo Etérico. Este, é um holograma do corpo físico, e toda esta somatização se vai materializar em forma de doença. “ Pensamento negativo, é  um aviso que não amamos quem somos”. Envolvemos aqui a Lei da Causa e Efeito, porque ao termos esta forma pensamento/sentimento, provocámos algo (Ex: Inveja). Quisemos essa experiência. No retorno atraímos e sentimos o seu efeito, porque tudo regressa à Fonte. O Leitor recorde que num dos capítulos anteriores mencionei que não existem bem nem mal, tudo é Energia. Trata-se apenas de uma aprendizagem que se adquire através de experiências. Daí o retorno.
Dei vários exemplos para que o Leitor entenda como atraimos. Somos o que criamos através do pensamento/sentimento.
Como a Mente Superior é uma Onda Eletromagnética, Ela apresenta-nos infinitas possibilidades e nós como observadores, podemos  cocriar e escolher nossa própria realidade e até de a alterar provocando uma situação, esperando a ressonância da Frequência em que vibramos no momento do resultado e de acordo com o Sentimento em que estamos nesse momento, ou seja no Agora. Recordo que o Universo é atemporal, não existem passado e futuro, apenas experienciamos o AGORA e é aqui que tudo acontece. O leitor faça uma comparação: Em que momento pensa no futuro?  No agora. Quando relembra memórias passadas? No agora.
Ao observarmos esta Onda de infinitas possibilidades, a não localidade, escolhemos o que desejamos, e entramos nela em forma de informação. Partícula é Informação. O desejo se colapsa na Função de Onda e torna-se probabilidade, não realidade. Para isso temos que aumentar a probabilidade e desenvolvê-la para que se torne realidade. Basta que o Ego permita a passagem da Informação do Vácuo Quântico. Tudo está dentro de nós. Manifeste o que deseja, porque já lá está, apenas se permita. Somos Seres Multidimensionais. A consciência da Alma é Eterna. Ela está em si. É o nosso Átomo Permanente. Não somos humanos, mas sim Seres Espirituais experienciando uma vida humana (Ellaine Ourives).
 Podemos obter nosso desejo em três ocasiões: Relaxando a Mente esvaziando-a no momento em que estamos prestes a adormecer, ou ainda durante o sono. Também quando começamos a acordar. Para isso precisamos  de nos abstrair de sons violentos e de preferência escutar música suave, o corpo físico estar confortável e conservar nosso silêncio interior. Este género de música ajuda muito. Ao nos sentirmos num destes estados, iniciemos o desejo tornando-o realidade. Em ambas as situações entramos em ponto 0 (Zero), ou seja em estado Alfa e já no sono pode ocorrer chegar ao estado Teta. Na meditação profunda pode atingir o estado Teta também. Nesse estado de Silêncio Interior já  em completa Harmonia, todos os futuros estão em superposição, apenas precisa escolher e esse é o momento certo para projetarmos nosso desejo. Estamos em alinhamento com a Mente Superior. A Harmonia é um ESTADO DE FÉ.
Continua
fjcabral44@sapo.pt

HISTÓRIA DO MEMORIAL DE UMA ALDEIA

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A RÁDIO DOS MEUS PAIS E AVÓS
Locutores de vozes timbradas que voavam no vento entre a leveza do ar mas de rostos indefinidos, imaginados ao sonho das nossas vivências, que ainda hoje ecoam como seres espirituais, imaginários, mas que existiram na verdade como existem as urzes de um monte solitário e a estrela da manhã, que não morrem, que são eternamente guardadas no baú das recordações:
-- “Caros ouvintes estamos diariamente nas vossas casas e na vossa companhia, transmitindo em ondas curtas, longas e frequência modulada para todo o continente e ilhas”.
Os ouvintes ansiavam pela hora da transmissão dos seus programas preferidos. E vejo ainda minha avó atarefada desde o corar do dia, e à noite antes de se ajoelhar ante uma cruz de Cristo, pacientemente olhando a noite, esperava pelo “romance“ da Rádio Renascença. E em breve trecho a primeira lágrima cintila, e desliza lenta pelo seu rosto enrugado, melancólico, triste suportando o peso molhado do seu olhar e enleada pelo enredo do “Simplesmente Maria“ que despontava amores épicos e sofrimentos desmedidos, onde o sonho e o amor eram tão reais, que ás vezes nos pareciam tangíveis e palpáveis. E ao som dos moderníssimos rádios de válvulas e a pilhas, em pleno Verão depois do dia de suster uma enxada, que é matéria, peso bruto e lágrimas de dor, pelo fresco e no silencio da noite iluminada por estrelas cintilantes o rádio era colocado no parapeito de uma janela virada para a rua e á sua volta no largo as pessoas se acanhavam para ouvir um bom programa de “discos pedidos”, uma aposta bem conseguida da Rádio Altitude da Guarda:
-- Está?….
-- Estou sim boa noite…
-- Posso dizer a frase?…
-- Pode sim querido ouvinte….
(após repetir a frase certa que fazia a propaganda de qualquer produto ou empresa patrocinadoras, vinha a repetida pergunta)
-- Que disco quer ouvir?...
-- “O resineiro” da Tonicha ou “Ó tempo volta pra trás” do António Mourão ou simplesmente do António Calvário “Oração”, ou ainda Alberto Ribeiro em “O marco do correio”.
Seguiam-se as notícias da noite na Emissora Nacional com a habitual crónica do seu correspondente em Luanda sobre a guerra colonial:
-- Aqui Luanda fala Ferreira da Costa
(Olha, “Aquilo Anda” e repetia-se á boca pequena não fossem as paredes ter ouvidos):
-- (Os nossos bravos soldados travaram a investida de tropas rebeldes na zona de Moeda defendendo heroicamente o nosso território, não tendo sofrido qualquer baixa).
A voz representativa, determina identidades. O bem e o mal recebem corpos moldados pelo tom vocal do locutor e por todos os sons, lembrando que a música também fixa a narração oral. Transmite-se batalha á guisa de um jogo instalando oposição entre personagens ou situações diversas. Mas a rádio estava na moda e todos os dias a Rádio Renascença nos despertava com um programa musical “despertar“. E o Rádio Clube Português nos presenteava com um programa de acção e suspense “Graça com todos“. Com voz profunda como arrancada das profundidades de uma caverna o locutor anunciava: -- Episódio 99… e agora os fabulosos inspectores “Patilhas e Ventoinha“ irão desvendar o assombroso mistério do “roubo do ouro do tesouro Nacional“.
E a saga radiofónica continua aos domingos nas tabernas atrás de um copo de vinho quando os fãs clubistas escutavam com ares ansiosos as vibrações dos jogos de futebol ou de hóquei em patins. Portugal alinha com Ramalhete, Casimiro, Vaz Guedes, Cristiano, Leonel, Livramento. Eram exaltados, idolatrados por mais uma conquista do campeonato Europeu ou do Mundo. Estas vozes de rostos invisíveis despertavam-nos os mais variados sentimentos, alegrias imensas ou tristezas profundas e os seus discursos de amor nos uniam ou de ódio nos separavam.

SANFONINAS

dr. jose
Miga-lhe pão dentro!
Ao meio-dia, o capataz dera ordem para almoço. Serviram uma sopa quente. O Joaquim queixou-se ao patrão, que lhe respondeu:
– Assopra-lhe!
No final do dia, o Joaquim, que viera como os outros para a esgalha da cortiça, não quis continuar ali e mudou de patrão.
A cena repetiu-se: sopa quente, queixume; mas agora a resposta foi outra:
– Põe-lhe água fria!
Não lhe servia o patrão e o Joaquim despediu-se.
Terceiro patrão, terceira sopa quente, terceira queixa, terceira resposta:
– Miga-lhe pão dentro!
E o Joaquim ficou.
Contou-me meu pai esta história, ele que também trabalhara no Alentejo, pelos anos 30. Uma história que, na sua singeleza, mostra, por exemplo, a importância da sopa e do pão no que hoje chamamos a ‘dieta mediterrânica’, que é, no fundo, o modo tradicional de comer no Sul de Portugal; e também as dificuldades por que se passava então.
Muito se fala hoje dos comeres, porque a gastronomia se tornou património identitário e a culinária ganhou requintados foros, com o aparecimento daquele jeito de alindar o prato com duas ou três coisas, a que se dá o nome de gulodice (gourmet é o termo), porque se percebeu que são os olhos que comem e o estômago que jejue, porque lhe faz é bem!
Era assim. Nossos avós sabiam como se deviam amanhar em tempo de fartura, para, aquando de eventual penúria, terem com que se aviar. Frigoríficos não os havia. Na arca antiga se guardava, em sal, a carne do porco que se matara. Minha mãe, quando a bom preço se compravam dois centos de sardinhas, arranjava-as a preceito e guardava-as em salmoura, para se comerem mais tarde. E aqueles carapauzinhos alimados? E a petinga que se escondia depois nas papas de milho?...
Sim, como canta o Rodrigo, se, até há pouco, coentros e rabanetes não iam à mesa do rei, agora vão os coentros, os orégãos, o alecrim, o poejo (ai, essa sopinha de poejo e esse fresquinho licor do mesmo!...) e até se descobriu o significado último da frase «quem tem fome cardos come», porque os tronquinhos carnudos desses cardos que, na Primavera, se espalham pelo campo, ripados a primor, dão uma sopa com feijanito encarnado de comer e chorar por mais!...
Feijanito? O diminutivo bem português que, na comidinha, amiúde se usa para mostrar o que é nosso até no modo de falar!... Amigo, vai um jantarinho de grão?

O RELVADO

juiz
São muitas as pessoas que quando constroem a sua casa se lembram de, junto à mesma, implantar um relvado, porque fica bonito de ver. Mas será que alguém se interroga sobre a origem da utilização do relvado?
Embora essa origem seja muito recuada no tempo, não pode procurar-se a partir dos nossos antepassados enquanto eram caçadores-recoletores, porque de nada lhes valeria o facto de ter um terreno relvado em frente da gruta onde se abrigavam. A sua preocupação era apenas a de conseguir os alimentos de que necessitavam para o quotidiano.
Também quem visitasse a “Acrópole de Atenas, o Capitólio de Roma, o Templo Judaico de Jerusalém ou a Cidade Proibida de Pequim” não podia deparar com “um tapete verde”.1
Só no final da Idade Média nasceu a ideia de embelezar a entrada das residências particulares da aristocracia francesa e inglesa e também de certos edifícios públicos com esses tapetes. O hábito propagou-se entre a nobreza durante o período da Idade Moderna.
Para aquilatar do que então representava a ocupação dum terreno com relva, basta pensar não só no valor que tinha a propriedade agrícola, mas principalmente nos cuidados que exigia. A ostentação do relvado significava que o proprietário se podia dar ao luxo de desperdiçar uma parcela de terreno de tamanho considerável e que dispunha de criados suficientes para os poder ocupar em tal tarefa. Não nos esqueçamos de que então não havia máquinas para arar o terreno, para cortar a relva ou para fazer a rega automática. O relvado constituía, portanto, um sinal de riqueza, que contrastava com a pobreza dos camponeses que não podiam desperdiçar o tereno para semear relva que nada de útil lhes podia oferecer.
O relvado devia manter-se impecavelmente tratado, pois a aparência de desleixo denunciava a má situação económica do seu proprietário. Aliás, quando atualmente visitamos um povoado e verificamos que o jardim de uma casa se apresenta mal tratado, isso significa, pelo menos, que o dono não frequenta a residência ou que não tem dinheiro para lhe dar um aspeto melhor.
“Os palácios reais e os castelos da aristocracia transformaram o relvado em símbolo de autoridade”. Mais tarde, “os parlamentos, os tribunais, as residências oficiais dos presidentes e outros edifícios públicos exibiam o seu poder através dos relvados. Ao mesmo tempo esses tapetes verdes conquistaram o mundo do desporto”.
Os atletas dos vários desportos passaram a competir em campos relvados, nomeadamente nos jogos de futebol e de ténis importantes.
“As pessoas passaram a associar os relvados ao poder político, ao estatuto social e à prosperidade económica”.2
A disseminação dos relvados não se ficou pela Europa, mas espalhou-se pela América e chegou mesmo aos povos islâmicos.
Atualmente são vistos com frequência não só nos jardins dos mais abastados como no de pessoas economicamente mais modestas. Os cuidados a prestar ao campo relvado estão extremamente simplificados quer pelo enorme avanço tecnológico, quer inclusivamente devido à imaginação de algumas pessoas. A este propósito, não resisto a contar que, quando visitei, há muitos anos, um país europeu, verifiquei que na relva do quintal da casa, havia sido colocado um coelho, dentro de uma gaiola sem fundo, por forma a que o animal pudesse ir comento a relva daquele pequeno espaço. A gaiola era transferida de acordo com as necessidades alimentares do animal. Era uma maneira muito simples e proveitosa de cortar a relva, sem desperdícios, que muitos dos turistas de então apreciaram.
1Yuval Noah Harari, Homo Deus – História Breve do Amanhã, pág. 74, 75
2 Idem

Pedro Santana Lopes Um acto de justiça

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É uma longa história este acto de justiça.
Vou ter de contar a história de uma das maiores figuras que marcou a consciência do Sec. XX na vida portuguesa. Já em artigo anterior me referi a ele, por ter sido um grande e saudoso amigo. E comungo o que o Grande Alexandre Herculano escreveu : - “ o mister de recordar o passado é uma espécie de magistratura moral - uma espécie de sacerdócio. Exercitem-no os que podem e sabem porque, não o fazer, é um crime …”. Começou como jornalista em jornais nacionais e revistas. Artigos e criticas sobre teatro e cinema. De seguida passou para o cinema e foi o cineasta oficial do Estado Novo, mais por ser novo do que ser Estado. A revolução cultural do Sec. XX era o cinema, a “arte do movimento”.
Refiro-me ao cineasta, escritor, poeta, jornalista, apresentador e produtor de televisão, António Lopes Ribeiro. Nasce em 16 de Abril de 1908. Entusiasma-se pelo cinema e procura na Europa os maiores da nova arte. Orgulhava-se de ter atingido a maior idade em Moscovo onde conviveu com Eisenstein e Vortov, os grandes do cinema os mestres da nova imagem.
Regressado a Portugal segue com a sua câmara a política do Estado Novo. Um número impressionante de filmes – “ A Revolução do 28 de Maio”, “ O Feitiço do Império” e muitos, muitos outros.
Seguem-se outros filmes com os maiores actores portugueses que ainda hoje fazem as delícias de muita gente ( O Pai Tirano, A Vizinha do Lado, O Pátio das Cantigas ) etc. , etc. Só para mencionar alguns.
António Lopes Ribeiro representa 50 anos do cinema português.
Com o 25 de Abril, António Lopes Ribeiro é posto de parte. Perde os amigos, que são presos ou fogem para o Brasil e o pior de tudo perde o seu trabalho, a sua fonte de receita.
Recordo que um dia, telefona-me de Lisboa, estava eu em Fagilde, na minha casa e diz-me :- Sabes António, estou no zero absoluto !...
E é aqui que entra Pedro Santana Lopes. Nasceu em 1956. Desde novo se meteu na política. Foi muitas coisas, mas no Governo começou por ser Adjunto de Ministro, Assessor Jurídico de Sá Carneiro, Secretário de Estado da Presidência de Conselho de Ministros e em 1990 Secretário de Estado da Cultura. E é como Secretário de Estado da Cultura, que pratica o maior acto de justiça. Atribui a António Lopes Ribeiro uma pensão de Cem Mil escudos, que vai receber até à sua morte, aos 87 anos, no ano de 1995.
Foi uma honra, um privilégio, uma sorte, conviver, ser amigo do António Lopes Ribeiro, que carinhosamente tratava por António. Hoje e daqui, em nome do António, um grande Bem Haja ao Pedro Santana Lopes. Que Deus lhe pague.
Em 1983, ainda em sua vida a Cinemateca Portuguesa, dedicou-lhe um livro, grande livro em tamanho e páginas – 432. Aí está toda a sua obra.
O saudoso António, teve a amabilidade de me oferecer um exemplar que guardo como relíquia. Porém, antes teve o cuidado de corrigir algumas gralhas a caneta de tinta permanente. E pôs a seguinte dedicatória : - “ Para o António José Fortes, companheiro incansável de jornada, em louvor da sua imaginação quase cinematográfica “.
E, na página 55, no 10.º episódio – Jornalismo e Publicidade escreveu : - “ Também tenho colaborado muito gostosamente nas múltiplas iniciativas congéneres doutro bom amigo : António José Fortes, proprietário da empresa portuense “ The Portuguese Exporter”. Com ele organizei exposições a bordo de navios, que foram aos Estados Unidos, a Angola, à Europa do Norte . E a famosa “Carruagem Branca” cedida pela C.P., que percorreu todo o País e toda a Espanha com exposições itinerantes com produtos nacionais ou de promoção turística, forma publicitária inédita que atraía milhares de visitantes nas estações ferroviárias onde se detinha”.
De ti, António, a única coisa que tenho, são saudades.