PORMENORES E PARTICULARIDADES


CRAVELHOS , TRANCAS E TRAMELAS  
Graças à vida percorro ruas e ruelas da minha aldeia na sua santa solidão, à sombra de velhas arvores outonais e nem sequer reparo em particularidades e simples pormenores que nela existiram mas que fazem parte das minhas recordações e do nosso espólio rural. E hoje só num latejar desvairado e febril, só numa visível projeção dos meus sonhos os podemos imaginar como sombras crepusculares fazendo parte de uma memória coletiva das nossas aldeias. Os cravelhos, eram fechos em madeira, que antigamente eram muito comuns nas portas das palheiras e lojas do gado. Podiam localizar-se do lado esquerdo ou direito da porta, sensivelmente a meia altura, mas sempre no exterior. Muitas portas, além do cravelho, tinham no fundo um buraco para que os gatos pudessem entrar e sair livremente (as gateiras). As portas com cravelhos eram apenas fechadas no exterior. Portas e portões tinham rudimentares fechaduras, apenas fechavam o trinco, mas de um pequeno orifício pendia um fio ou um simples cordel que se puxava para abrir. As portas raramente eram fechadas à chave, eram tempos em que as pessoas se pautavam pelos valores da honestidade e da confiança, do espirito comunitário, da partilha e da amizade entre vizinhança. Mas numa verdadeira vida mais robusta ou singela para que resultasse um perfeito equilíbrio, trancavam-se as portas. A tranca era uma barra em madeira ou ferro que encaixava em covas escavadas nas ombreiras das portas. Colocava-se atravessada para a fechar quando esta era dividida ao meio. Ainda hoje se usa a expressão de quando as portas não tinham trancas e prevalecia o beneficio do alheio: “depois de casa roubada trancas à porta“. A tramela é uma tranca moldada em madeira , com um ferro ao centro pregada no batente da porta podendo ser girada . Existiam casa com portas em que a parte inferior era fechada , existindo na parte superior uma abertura para arejamento e entrada de luz para o interior da casa , eram as portas com postigo . E o povo sempre ufano quando o cravelho era ineficaz, não enjeitava o rifão: “cravelho que encravou, para abrir se arrombou “. Dir-se-ia que para os amigos do alheio não existiam entraves, houvesse cravelhos, trancas ou tramelas.