SANFONINAS

Numa bola de sabão
Cuidou Umberto Maria Milizia do livro – quase catálogo de exposição – sobre a produção artística de Eugenia Serafini entre 1993 e 2003, publicado em Roma (2003) por Edizioni ARTE COM. Sintetiza Umberto, na nota introdutória, o currículo de -Eugenia e, no final, faz-lhe uma pergunta:
«Eu vi-te viajar numa bola de sabão. Eu vi! Quanto custa o bilhete?»
Não havia mais para ler; mas, se o houvera, eu me quedaria aí, a saborear o achado! Viajar numa bola de sabão – que bom seria!… Vêm-nos à mente as nossas brincadeiras de menino, tão bem retratadas, aliás, no célebre quadro a óleo de Edouard Manet, patente no Museu Gulbenkian, em Lisboa, em que é retratado o seu filho a fazer bolinhas de sabão. Escreve um dos entendidos nessas interpretações pictóricas que o pintor quis representar nessas bolas «o sentido da existência efémera».
Não terá pensado nisso Umberto Milizia, mas sim no enlevo que a contemplação das obras de arte amiúde nos desperta, nessa vontade de sermos leves e… ir por aí, à deriva, a saborear a vida que nos é dado viver, a paisagem que se nos oferece. Os concursos que fazíamos em pequenos: quem faz a bola maior? Quem consegue fazer mais? E uma dentro da outra? Mãe, compras-me uma daquelas coisas que dão para fazer bolinhas, compras? Sim, que hoje há «coisas para fazer bolinhas», outrora qualquer palhinha servia, mesmo de feno. E misturava-se sabão azul e branco num copo d’água. Estava feita a engenhoca. Para brincar até cansar!
Há, contudo, um senão a ensombrar Umberto: «Quanto custa a viagem?». O repentino contraste entre a elevação do conceito e os pés-na-terra a pesarem na escolha.
Não revela Umberto Milizia qual foi a resposta da minha Amiga Eugenia Serafini. Não nos custa, porém, adivinhar qual terá sido:
– Esta viagem é de graça, Umberto!
Sim, a partir da contemplação da Natureza e das obras de Arte que mui sabiamente no-la revelam, há viagens boas e gratuitas que importa aproveitar, a contrapor com urgência às imagens de ruinosa desgraça que a voracidade de alguns «homens» teimam em nos proporcionar.
Contemplo a tonalidade já verde dos campos de Castro Verde. No ar, planando, suaves, quais bolinhas de sabão, um casal de abetardas. Também esta viagem é de graça!