SANFONINAS

Esta Babel em que estamos!
Chama-se Fonética a ciência que estuda os sons humanos. Linguística é, por seu turno, a forma de os exprimir por signos.
Admiramo-nos, de vez em quando, com a infinidade de línguas e dialectos – e respectivos signos estranhos – vigentes pelo nosso mundo. Conta a Bíblia, no livro de Génesis (11, 1-9), cujo inspirado autor também terá ficado pasmado ao verificar tamanha diversidade, que foi esse um castigo de Deus, por o Homem O ter querido alcançar, construindo imensa torre, a «torre de Babel». E que castigo! – podemos exclamar nós, hoje, ao sentirmos a dificuldade em nos entendermos nessa verdadeira babel.
Foi, em tempos, o Latim uma língua quase universal, em boa parte do mundo dito, então, “civilizado”. Houvera antes, diz-se, o indo-europeu. Em 1887, Ludwik Lejzer Zamenhof criou o esperanto, em jeito de aglutinação, para todos nos entendermos; o inglês aspira, agora, a ser esse elo privilegiado. O certo é que… as diferenças mantêm-se e até se corre sério risco de se acentuarem, haja em vista, por exemplo, o que se passa na vizinha Espanha, com a crescente afirmação do catalão, do basco, de galego, do valenciano… face ao castelhano adoptado há muito como língua oficial.
Vêm estas considerações a propósito das bem oportunas crónicas «Mais linguagem à moda antiga», inseridas por João Lourenço Roque no seu mais recente livro Digressões Interiores 3 (Palimage, Coimbra, 2021). Mostra João Lourenço Roque com inúmeros exemplos como é que a população da sua zona beirã (freguesia de Sarzedas, concelho de Castelo Branco) se exprime no quotidiano, Há expressões e palavras próprias; mas há, sobretudo, uma forma própria de as pronunciar: o som ar final transforma-se em er – escuter (por escutar), esbarrguer-se (por esbarregar-se)…
Vale a pena sorrirmos com uma das pitorescas frases que cita (p. 34) e que só pronunciada em voz alta se logra compreender:
«Antontem andava a labrar com os bezerros, espindurei a marenda numa carrasqueira baixa, quando dei pela trilha um cão esfrangalhou-me a bolsa toda, comeu-me o conduto e abalou com o pão nos dentes».