Demência, a impotência do cuidador


Todos somos únicos, com memórias únicas, histórias e ideias que suportam a nossa identidade. O fato de reconhecermos alguém, de termos relações de amizade, de ser indivíduos numa sociedade que exige uma constante adaptação, confere uma autonomia obrigatória.
Mas o que acontece quando a nossa identidade\autonomia começa a desvanecer?
Imagine aquele ícone, aquela pessoa, que sempre esteve presente, que sempre teve um sorriso, quando precisávamos, sem pedir! Aquela personagem, que atendia o publico, com ar cansado, mas sempre afável e cortês. Que, com o passar dos anos, já conhecia os nossos paladares, sabia pelo nosso andar, pela nossa expressão, que tivemos um dia terrível, e tinha sempre uma palavra de conforto! Aquela personagem, que mãe, filha e neta, conheciam desde há anos, à frente daquele negócio! Agora, imagine que essa pessoa, deixa de falar consigo, olha para si com estupefação quando você lhe dirige a palavra. Chega mesmo a ser agressiva, e indelicada, sem motivo que justifique tal comportamento!
A demência, quase sempre prevalente nos idosos, é um conjunto de sintomas, que culminam num declínio mental, que pode ser progressivo ou transitório, mas sempre irreversível. As causas das demências ainda são desconhecidas, podendo estar associadas a lesões cerebrais, ou doenças infeciosas, no entanto uma certeza irrevogável, é a incapacidade de a pessoa idosa ser autónoma. Também, se torna evidente, através de dados estatísticos, a relação entre a síndrome demencial e a institucionalização. Nos dias de hoje, o impacto de cuidar de um idoso com demência, empurra a família para um desgaste emocional, acarretando indisponibilidade, quer presencial, quer financeira. Os parcos apoios sociais, aliados à incompreensão cultural, levam à obscuridade e ocultamento da situação. Por vezes, a negligência ou o abandono, são as saídas das muitas famílias, que estão sobrecarregadas com as suas responsabilidades diárias, da sua família nuclear.
Mais uma vez, glorifico a importância da educação para a saúde, no cuidar em pessoas de idade avançada. Outrora, existia um cuidador – quase sempre remetido à mulher, que seria a filha solteira ou uma nora- que tratava da alimentação, higiene, prevenção de qualquer ocorrência que colocasse em risco o idoso. Hoje em dia, já existe o estatuto do cuidador informal (consultar Segurança Social), mas muito se perdeu nas últimas décadas, na dedicação em cuidar um idoso, especialmente com uma demência. Porque cuidar de alguém, que é agitado, agressivo, delirante, com mania de perseguição entre outros comportamentos disruptivos, coloca o stress enorme no cuidador. Não desespere, não carregue uma culpa infundada, porque ficar agressivo e revoltado, é natural. Afinal quem escolhe ficar demente?