A VINICULTURA DESDE A SUA ORIGEM

DR, JORGE
Foram encontrados na Gronelândia e outras regiões hiperbóreas os primeiros fósseis de plantas consideradas ancestrais das videiras que remontam ao Período Terciário.
Supõe-se que datam da Idade da Pedra as mais antigas vinhas da Terra cultivadas na Geórgia, região do Cáucaso.
O vinho chegou ao sul da Itália, através dos gregos, a partir de 800 a. C., mas etruscos que viviam a norte, na região da atual Toscana, já elaboravam bons vinhos e os comercializavam na Gália e, talvez, na Borgonha. Com a expansão de Roma difunde-se o comércio do vinho pelo Mundo. Os romanos dedicaram-se à viticultura, que atingiu o auge da sua expansão. O senador Catão foi o primeiro a escrever sobre o tema criando a obra De Agri Cultura. Mas a obra mais famosa foi escrita pelo cartaginês Mago, tendo sido traduzida para grego e latim. Nesta era aconselhada a plantação intensiva de vinhedos como forma de obter divisas1.
Por volta do ano 404 a. C., foi escrita uma das mais famosas peças de teatro sobre o deus Baco, ou Dionísio, pelo dramaturgo Eurípides, de Salamina, que passou a maior parte da sua vida em Atenas.
Uma descoberta recente evidencia como os gregos gostavam de vinho: a adega do rei Nestor, de Pilos, cidade da Peloponésia, no sul da Grécia, tinha uma capacidade que foi estimada em 6.000 litros, onde o vinho era guardado em grandes jarras denominadas “pithoi”.O vinho era levado até à adega dentro de bolsas de pele de cordeiro e de outros animais, o que certamente lhe emprestava um certo “buquê”.
Júlio César definiu uma lei agrária, que estará, porventura, na origem dos vinhos Borgonheses denominados “romanées”. Atualmente o Romanée – Conti é um vinho francês produzido em Vosne Romanée, na Côte de Nuits, no leste de França. É considerado um dos melhores de França. As vinhas remontam ao século XV, plantadas pelos monges de Saint-Vivant.
Depois de uma carreira no exército, onde chegou ao posto de tribuno na Síria, Lúcio Colunella, espanhol de Cádis, escreveu o Tratado “De Re Rustica” em 12 volumes (34 a. C.), a maior fonte de conhecimento sobre agricultura romana. O livro contém tudo sobre viticultura, desde a poda até à colheita das uvas.
Também Plínio o Velho (Caio Plínio Segundo) compilou ao longo de vários anos e publicou entre 77 e 79 d. C. uma enciclopédia, Naturalis Historia, composta de 37 livros. Cita os grandes vinhos de Roma, técnicas de vinificação e as qualidades medicinais desta bebida.
Galeno, que foi médico de Marco Aurélio, compilou todas as informações que conseguiu colher sobre vinhos da época em um Tratado que intitulou De Antidotis. Originalmente foi escrito com o objetivo de enumerar as misturas que se poderiam adicionar aos vinhos por forma a evitar o envenenamento do Imperador romano. O livro pode ser considerado a primeira compilação de vinhos do Mundo.
Carlos Magno promulgou leis agrárias, especialmente as ligadas ao vinho, com rígidas normas atinentes à sua produção. Ele próprio mandou plantar vinhas em locais especiais e o nome Charlemagne foi dado a vinhedos situados na Borgonha.
Omar Khyam, poeta, matemático e astrónomo persa do séc. XI e XII, foi um dos maiores cientistas da sua época, tendo elaborado um calendário mais preciso que o gregoriano. Apesar dos preceitos islâmicos proibirem a ingestão de vinho, rebelou-se contra tal proibição, sendo da sua autoria a obra Rubaiyat (em português, quadras) em homenagem à bebida.
Bernardo de Fontaine, também conhecido como Bernardo de Claraval expandiu a ordem de Cister por toda a Europa. Os monges de Cister deram grande incremento aos vinhedos de Borgonha. Desde a sua fundação se entregaram à viticultura após terem recebido o primeiro vinhedo em Meursault.
Como é consabido, a Igreja Católica defende o simbolismo do vinho na sua liturgia, o que estimulou certamente a vitivinicultura em todo o Mundo. A Igreja tornou-se proprietária de muitos vinhedos nos mosteiros das principais ordens religiosas e ensinando a melhor forma de produção da bebida que representa o “sangue de Cristo”.
Em 1152, Leonor da Aquitânia, ex- rainha de França, casou-se com Henrique Plantagenet, que veio a ser Henrique II de Inglaterra dois anos depois. Este facto marcou de modo definitivo a história dos vinhos de Bordeaux.
A sede do Papado foi transferida para Avinhão em 1305 e aí se manteve por um período de 70 anos. Em 1348, o Pontífice Clemente VI adquiriu a cidade e integrou-a nos domínios da Igreja romana. Os vinhedos localizados na região situada em torno da sede do Pontificado, conhecida pelo nome de Chateauneuf du Pape deram origem a um vinho que ficou famoso até aos nossos dias.
A influência dos Monges de Cister foi determinante quanto aos vinhos de Borgonha. No começo do séc. XIV eles adquiriram o vinho de Clos de Vougeot, que se tornou o vinho mais famoso da região por séculos. Clos de Vougeot é uma vinha murada para a proteger dos furtos e também para melhorar o próprio ambiente climático. As terras foram compradas pelo Mosteiro ou foram recebidas em doação a partir do séc. XII e até ao séc. XIV.
Após os descobrimentos a vinha foi levada para as novas terras pelos colonizadores, pois o vinho não suportava a longa viagem a partir da Europa. Assim nasceram, por volta do ano 1550, as primeiras vinhas no Novo Mundo levadas por portugueses e espanhóis.
Em Maio de 1532, um fidalgo português de nome Brás Cubas, nascido na cidade do Porto em 1507, tornou-se o primeiro viticultor do Brasil. Depois de uma experiência pouco bem sucedida na cidade de Cubatão, procurou terrenos mais propícios próximos de Taubaté e conseguiu a produção de vinhos de qualidade.
O monge beneditino Dom Pérignon é considerado o pai do champanhe. Tendo sido nomeado tesoureiro da abadia de Hautvillers em 1668, procurou aprimorar a produção do vinho criando várias regras. Obteve sucesso quanto à efervescência do champanhe, mas era seu desejo evitar as borbulhas.
A qualidade do vinho também depende das castas das uvas. Cabernet Sauvignon teria aparecido acidentalmente em meados do século XVII devido ao cruzamento entre Cabernet Franc e Sauvignon blanc. No século seguinte esta casta já era considerada uma das variedades mais importantes de Bordeaux, na altura conhecida como Petite Vidure.
A primeira menção a um châteaux surge escrita em 10 de Abril de 1663, no diário de Samuel Pepys, um inglês de cerca de 30 anos, que relata que havia passado a noite a beber um vinho peculiar que designava por Ho Bryan. Era o Châteaux Haut Brion, o primeiro vinho de Bordeaux comercializado com o nome da propriedade onde havia sido produzido.
Como já tivemos oportunidade de referir, a maioria dos vinhos não suportava as viagens transatlânticas. Aconteceu, porém, que em 1770 um carregamento com destino às Índias voltou à Europa e, quando as pessoas julgavam que estariam estragados, aperceberam-se de que os vinhos fortificados, como o Madeira, haviam melhorado. Assim nasceram os vinhos de “Retours des Indes”, que foram muito apreciados.
Em 1775, numa abadia da Alemanha a colheita das uvas tinha sido autorizada pelo bispo com 14 dias de atraso. Algumas uvas já se encontravam podres, mas a vindima foi feita, embora sem grandes esperanças de que produzissem bom vinho. Verificaram, porém, que o vinho era muito melhor. Assim surgiu a ideia da vindima tardia.

1 Seguiremos essencialmente Marcio Bontempo, in A Saúde da Água Para o Vinho.